Por Marco Faustino
Casos de familiares que se recusam a enterrar os seus entes queridos por acreditar que ainda estejam vivos, por mais incrível que possa parecer, não são incomuns. Geralmente, no entanto, esses casos acontecem comumente em países considerados subdesenvolvidos por uma série de fatores, tanto de saúde pública, que geralmente é precária e nem um pouco confiável, quanto religiosos, uma vez que as crenças religiosas somadas a não aceitação da perda de um parente, ainda mais sendo um filho ou uma filha, acabam gerando inúmeros complicativos para que as pessoas compreendam que, infelizmente, seu ente querido não está mais entre nós, sendo que não há nenhuma técnica comprovada que possa reverter esse tipo de situação. Particularmente, fico muito sensibilizado com casos assim, e sempre penso dez vezes antes de trazer tais histórias para vocês, porque acima de tudo prezo pela vida e dignidade humana, algo que nem sempre a mídia se preocupa em fazer. Lembro como se fosse hoje, dos casos referentes as jovens Nelsy Pérez e Priscila Toribio. O primeiro aconteceu em Honduras, sendo que havia a suspeita que a jovem tivesse sido enterrada ainda com vida, muito embora até hoje eu possua uma certa desconfiança em torno de sua morte, e a real responsabilidade do seu marido (leia mais: A História de Nelsy Pérez: A Garota Que Pode Ter Sido Enterrada Viva em Honduras). Já o segundo aconteceu na República Dominicana, quando familiares teriam visto a menina lacrimejando durante o funeral, e causaram um verdadeiro rebuliço no município de Villa Gonzalez, por acreditarem que ela estivesse viva (leia mais: O Caso Priscila Toribio: Jovem "Lacrimeja" Antes de Ser Enterrada e Causa Desespero em Seus Familiares, na República Dominicana).
Agora, muitos de vocês nos enviaram uma história sobre uma jovem chamada Débora Isis, cujos familiares teriam se recusado a enterrar a jovem devido a suspeita que a mesma estivesse viva, na cidade de Rio Largo, na região metropolitana de Maceió, no Estado de Alagoas. Toda a situação gerou uma grande comoção, assim como uma verdadeira confusão durante o velório da menina. Os familiares alegavam que a menina não apresentava nenhum odor característico, teria lacrimejado, e até mesmo movido um membro do corpo, situações essas que populares atribuíram a um eventual milagre de Deus. Para completar, a mãe da menina alegou para a imprensa que a família tinha histórico de catalepsia (um estado de imobilidade e inatividade do corpo inteiro, fazendo que o indivíduo fique na mesma posição em que foi colocado por um longo período de tempo). Contudo, será mesmo que a menina tinha alguma chance de estar viva? O que será que levou a família a realmente pensar que a menina estivesse viva? Vamos saber mais sobre esse assunto?
Entenda Como Toda Essa História Começou: O Drama Vivido pela Família de Débora Isis
Apesar da mídia ter fragmentado muito essa história, tornando-a extremamente confusa para o entendimento do leitor, vamos tentar delinear uma linha do tempo em relação aos acontecimentos desse caso para vocês, combinado? Se vocês souberem de alguma informação ou a mesma conter algum erro, peço por gentileza que deixem a correção nos comentários.
Toda essa história ocorreu na cidade de Rio Largo, um município pertencente a Região Metropolitana de Maceió, localizado a aproximadamente 23 km a noroeste da capital do Estado de Alagoas. Ela é a segunda cidade mais populosa dessa região metropolitana, e a terceira maior do estado, contando com pouco mais de 75 mil habitantes segundo a última estimativa divulgada pelo IBGE, em 2014. Diga-se de passagem, a cidade abriga o principal aeroporto do Estado, o Aeroporto Internacional Zumbi dos Palmares.
o nome Rio Largo originou-se de um engenho de açúcar existente no local, onde o rio Mundaú possui a sua maior largura. No fim do século XIX foram fundadas duas unidades para a industrialização de fibras têxteis, em trechos de pequenos encachoeiramentos do rio Mundaú, favoráveis a esse tipo de atividade fabril. Também é importante destacar, que nesse período surgiu a "Usina Leão", que se tornou, na época, uma das maiores do setor em toda a América Latina.
Apesar do passado glorioso, Rio Largo aparece na 15ª posição de acordo com o último "Mapa da Violência do Brasil", divulgado em maio desse ano, e que analisou os homicídios com o uso de armas de fogo, entre os anos de 2012 e 2014, em cerca de 3 mil municípios brasileiros, que juntos concentram 98% dos homicídios do país.
O cotidiano da cidade começaria a ser totalmente alterado, quando uma jovem chamada Débora Isis, 18 anos, começou a ser tratada durante um mês, ainda em sua casa, devido a uma suposta "virose". Posteriormente, devido ao agravamento de sua condição de saúde, ela foi levada ao Hospital Geral Professor IB Gatto Falcão, na própria cidade de Rio Largo. Foi nesse momento, que teria sido constatada uma infecção intestinal, urinária e generalizada, sendo aplicado uma espécie de soro sedativo (sendo que alguns sites de notícias citam que teria sido administrado um calmante, mas não citam o nome do medicamento), o que acabou resultando em uma série de convulsões.
No dia 8 de novembro, a jovem deu entrada no Hospital Vida, um hospital particular de Maceió. No dia 12, as 14h10, a jovem foi dada como morta. Na certidão de óbito constava apenas que ela havia morrido em decorrência de uma infecção renal (alguns sites de notícias também informavam uma parada cardíaca, algo que iremos conferir daqui a pouco).
Confira um vídeo publicado pelo "Portal Tribuna", em seu próprio canal no YouTube, no dia 14 de novembro, sendo que em 2:04 e 2:19é possível notar os dedos da jovem se mexendo, quando um dos familiares toca e pressiona sua mão (essas imagens identificadas como sendo de Ana Paula Omena foram uma das que mais viralizaram nas redes sociais):
"Ela não está morta. Ela tem sinais de vida. Ela não está com a temperatura de morto. Acredito que minha filha está viva", disse Teresa, em entrevista para o Portal G1, cuja cobertura, na verdade, foi realizada pela TV Gazeta, uma afiliada da Rede Globo, com sede em Maceió.
"Antes de ir para o HGE, ela foi para o Hospital IB Gato Falcão. Lá eles aplicaram um soro sedativo e depois disso a menina começou a convulsionar e foi transferida para o HGE. Lá constataram infecção intestinal, urinária e generalizada. De lá, ela estava quase em coma, quando foi transferida para o Hospital Vida, onde atestaram o óbito dela no domingo", disse o irmão Davi César Mendes, 15 anos, que também dizia acreditar que a menina estivesse viva.
Foi gerada uma grande confusão na porta da residência de Teresa, local onde a menina foi velada entre domingo (12) e terça-feira passada (14), fazendo com que a Polícia Civil fosse acionada. |
Teresa Cristina Mendes, 48 anos, assim como diversos outros familiares, alegavam a jovem não havia morrido |
Ela alegou ter passado por essa situação, quando tinha apenas dois anos de idade. Confira sua declaração para o Portal G1, que foi publicada por um canal de terceiros, no YouTube:
"Esse problema acontece na família. Quando deu um ataque em mim, eu tive uma dor muito forte na perna e eu fiquei assim, só retornei depois de quatro dias. Esse problema está se agravando e vem acontecendo na família", disse Teresa. Aliás, os moradores da região também diziam acreditar que a jovem estivesse viva.
"Eu acredito em um Deus vivo. É uma menina evangélica. A mãe dela não é louca. Ela não está cheirando mal. É capaz de ela se levantar dali para mostrar a muita gente que Deus existe", disse Ailton Gabriel dos Santos, 43 anos, um vizinho família, que esteve na casa de Débora e fez uma oração com a família na manhã da última terça-feira (14). Ele também alegou que viu a menina chorar.
O delegado Manuel Wanderley Cavalcante, titular do 12º Distrito Policial, foi ao local onde Débora estava sendo velada, e pediu uma nova avaliação médica para confirmar a morte da jovem. Ele disse a imprensa, que se ficasse comprovado que o hospital havia liberado o corpo sem óbito, eles iriam responsabilizar o mesmo.
Por outro lado, o promotor de justiça Magno Alexandre Moura, da 2ª Promotoria de Justiça de Rio Largo, e que esteve na casa de Débora Isis, disse acreditar que a jovem estivesse mesmo morta, mas que ainda assim a menina passaria por um exame de catalepsia e por um parecer médico do Instituto Médico Legal.
O delegado Manuel Wanderley Cavalcante (à esquerda), titular do 12º Distrito Policial, e o promotor de justiça Magno Alexandre Moura (à direita), da 2ª Promotoria de Justiça de Rio Largo. |
Já em relação a essa suspeita de catalepsia, o médico legista Kleber Santana explicou ao Portal G1, que essa seria uma situação rara, e que a possibilidade de alguém neste estado ser declarado equivocadamente como morto era pequena.
"A catalepsia se manifesta quando o organismo entra no nível basal, de consumo mínimo de energia. A pessoa diminui a quantidade de batimentos cardíacos, de impulsões respiratórias. Ela apresenta sinais vitais, mas são mínimos, e assim ficam imperceptíveis ao tato, à audição. São esses sentidos que a gente utiliza para dar um diagnóstico imediato", explicou Kleber Santana.
As Diversas Versões Apontadas pelos Familiares de Débora Isis: Família Acusa Hospital Particular de Negligência e que Jovem Teria Morrido Por Asfixia Devido a Algodões Colocados em Seu Corpo
Durante o grande tumulto que se formou em frente a casa de Débora Isis, com populares clamando por Justiça e proferindo palavras de ordem, o delegado Manuel Wanderley Cavalcante determinou que o corpo da jovem fosse levado ao Serviço de Verificação de Óbitos (SVO) naquela mesma manhã. A mãe de Débora alegava que o corpo não havia passado por uma autópsia, procedimento que poderia atestar a verdadeira causa da morte da garota, declarada no último domingo (12).
Durante a manhã da última terça-feira (14), dezenas de pessoas se aglomeraram em frente a casa da mãe de Débora |
Confira também o momento em que o caixão de Débora é retirado da casa da casa de Teresa e levado até um carro funerário da Secretaria de Saúde de Rio Largo, através de um vídeo realizado pelo Portal TNH1, e publicado em um canal de terceiros, no YouTube:
Confira também esse três outros vídeos, sendo os dois primeiros foram realizados pela TV Gazeta, onde mostra a discussão da mãe de Débora com alguns populares, que se aglomeraram na frente de sua casa, e posteriormente sua conversa com o delegado Manuel Wanderley Cavalcante. Já o terceiro mostra o clamor popular por "justiça" e o pedido para que o caixão fosse aberto:
Assim sendo, diversos veículos de imprensa começaram a entrevistar os familiares de Débora, entre eles estava o site do jornal Extra, que entrou em contato com Marta Gouveia, 21 anos, irmã da referida jovem. Ela disse que a irmã havia dado entrada no Hospital Geral do Estado (HGE), no dia 6 de novembro, com diagnóstico de infecção urinária e depressão, sendo que no último domingo, a jovem teria morrido após um quadro de infecção generalizada e um enfarto.
Além disso, Débora tinha precisado passar por uma reanimação cardíaca na quinta-feira retrasada (8) e no domingo (12) teria passado pela última reanimação, que não foi bem sucedida. Os familiares teriam optado por acionar uma funerária e levaram o corpo da jovem para casa. A irmã de Débora contou que a família retirou os algodões do nariz da jovem, mas manteve os que estavam na boca. Segundo Marta, a enfermeira disse que se eles retirassem iriam sentir um certo mau cheiro, e que eles acabaram tirando apenas os algodões do nariz.
"Eu acho que não reanimaram ela no domingo. Deixaram ela morrer. Fizemos todos os exames nela e falaram que ela estava com diabetes também. Depois, teve a infecção generalizada e os rins pararam. No domingo ela piscou um olho, estava respirando fraquinho. Ela se mexeu. Procuramos um médico daqui de perto, mas ele tem problemas com a minha família e se recusou a atender. O corpo ficou no caixão, na nossa sala. Checamos o tempo todo, estávamos abrindo os olhos dela para ver se tinha o brilho, verificamos a pele dela, a temperatura também estava tudo normal. Verificamos até a pressão dela, mas não dava nada. Era muito fraca", disse Marta, que continuava achando que sua irmã havia morrido por falta de atendimento médico.
Foto da mãe de Débora aguardando o resultado do exame do IML para saber se sua filha estava realmente morta |
"O óbito dela foi constatado pelo hospital às 14h10 do domingo. A unidade emitiu uma certidão de óbito e liberou o corpo. O procedimento certo era ir direto para o Serviço de Verificação de Óbitos do Estado, mas a família pegou o corpo, chamou uma funerária e levou para casa. No mesmo dia, por volta das 21h, eles disseram que ela respirou. Colocaram na cabeça que ela estava viva. Passou a segunda-feira e eles não procuraram ninguém. Hoje fui lá, sustei o velório, isolei a área e transladamos o corpo para o IML", disse o delegado.
"O que nos intriga e que vamos investigar é se ela realmente faleceu às 14h10 do dia 12 ou se morreu posteriormente por asfixia provocada pelos algodões colocados no nariz e no esôfago. Caso fique comprovado que ela morreu depois, o hospital será responsabilizado", completou, dizendo que em 38 anos de profissão era a primeira vez que tinha visto um caso como esse.
A mãe de Débora se mostrou muito apreensiva durante o período que aguardou pelo exame do IML. Ainda ela mantinha uma forte esperança de que a filha pudesse estar viva. |
"Eu senti sinais vitais na minha irmã mesmo após o atestado. O corpo chegou em nossa casa às 20h30. Ainda corremos para chamar um médico na Secretaria de Saúde do Município de Rio Largo. O responsável olhou, disse que voltaria, mas não voltou. São tantos erros, tanta falta de assistência", disse Paulo Daniel, que também acusou, o Hospital Vida, onde Débora esteve internada, de negligência, já que foi essa a unidade de saúde responsável por atestar a morte da jovem sem acionar o Serviço de Verificação de Óbitos (SVO).
De acordo com o rapaz, a família passou a alimentar dúvidas desde a liberação do corpo, no último domingo (12), já que a jovem ainda estaria apresentando sinais de vida. Segundo ele, o hospital teria atestado o óbito da jovem sem que a mesma apresentasse características de morte.
De acordo com o rapaz, a família passou a alimentar dúvidas desde a liberação do corpo, no último domingo (12), já que a jovem ainda estaria apresentando sinais de vida. |
"Afirmamos que temos plena confiança em nossos colaboradores e nos profissionais que aqui atuam. A Direção coloca-se à disposição da família para qualquer tipo de esclarecimento que se fizer necessário, de forma legal", informava o documento.
Estranhamente, em uma reportagem realizada pelo AL TV 2ª edição (TV Gazeta), da última terça-feira, a mãe de Débora, não apontou o nome catalepsia para justificar o estado de sua filha, ela usou o termo "coma reduzido" (embora imagina-se que ela tenha tentado falar "induzido") e, além disso, ela mencionou que uma psicóloga teria conversado com a menina e teria dito que "ela não estava doente, não tinha nada, apenas uma depressão profunda" (lembrando que depressão é uma doença), e que ela precisava fazer um esforço para melhorar, visto que a depressão causava os sintomas que ela vinha apresentando. Confira a reportagem abaixo, que foi publicada em um canal de terceiros, no YouTube:
Além disso, Teresa disse que a menina estaria de "manha", ou seja, "birra" e, aparentemente, indicou que o estado da filha teria sido o resultado do excesso de calmantes ou sedativos, que teriam sido administrados na mesma, ainda acreditando que a filha estivesse simplesmente dopada. Posteriormente, o irmão de Débora concedeu entrevista e disse que Débora, vinha se alimentando mal e estava cada vez mais fraca ao longo do tempo, antes desencadear uma infecação urinária. Estranho, não é mesmo?
O Texto Preliminar do Instituto Médico Legal: Débora Isis Estava Morta há 48 horas
Entretanto, apesar das esperanças da família, ainda na tarde da última quarta-feira (14), o perito Kleber Santana, do Instituto Médico Legal (IML), descartou a hipótese de catalepsia envolvendo a jovem Débora Isis, cujo corpo estava sendo velado já há três dias. Segundo ele, a jovem já apresentava sinais do óbito. Posteriormente, as 19h24, a morte da jovem foi confirmada por uma perícia oficial do Instituto Médico Legal.
De acordo com um texto preliminar do IML, a jovem estava mesmo morta desde o último domingo (12), conforme atestado de óbito emitido pelo Hospital Vida, onde a jovem estava internada. A médica legista, Magda Vilela, informou que vários fatores causaram a morte. Confira a nota divulgada:
"O Instituto de Medicina Legal Estácio de Lima informa que após realização de exame de necropsia ficou confirmada a morte da jovem Débora Isis Mendes de Gouveia, 18 anos de idade.
No exame de necropsia realizado pela perita médica legista Magda Vilela ficou constatado que a vítima estava morta há mais de 48 horas.
O laudo cadavérico completo, com todas as informações sobre a causa da morte, será encaminhado para o 12° Distrito Policial de Rio Largo no prazo de 10 dias úteis.
O corpo Débora Isis foi liberado para sepultamento"
Teresa segurando a "Guia de Sepultamento" de sua filha, a Débora, na noite de terça-feira (14) |
Em uma tentativa de explicar o caso, o programa "Cidade Alerta Alagoas", da TV Pajuçara, emissora de TV afiliada da Record TV, conversou com um médico legista, o Dr. Gerson Odilon, que por sua vez alegou possuir 30 anos de experiência nessa área.
"Existem sinais imediatos e consecutivos de morte. Nos sinais imediatos são constatados a ausência de respiração, do batimento cardíaco, do movimento dos olhos e a não dilatação da pupila no momento em que se insere luz nos olhos. Assim que é percebida a constatação destes e de outros sinais cadavéricos, já pode atestar o caso como óbito, mas estou explicando de um modo geral. Não posso falar aleatoriamente porque não vi o corpo da menina", disse o Dr. Gerson.
Confira o trecho completo do programa em que o Dr. Gerson é entrevistado, assim como uma reportagem realizada sobre o caso, através de um canal de terceiros no Vimeo:
Durante o programa, exibido na última quarta-feira, foi questionado ao legista se era normal o corpo, mesmo 48h após o atestado de óbito, não apresentar sinais de decomposição. Gerson Odilon explicou que seria necessário saber a causa da morte, principalmente se houve a ingestão de antibióticos.
"Se a Débora teve o uso prolongado de antibióticos, com certeza a constatação do óbito vai demorar, porque isso só é possível com a existência de bactérias atróficas que existem no intestino. E o uso prolongado desse tipo de medicamento faz com que as bactérias morram. Em todos esses anos trabalhando no IML, só vi dois fenômenos parecidos, caso seja constatada a catalepsia da menina. Eu acredito muito que já esteja em óbito pelo tempo decorrido do fato, mas isso só será possível com a palavra final do segundo examinador", completou.
O Enterro de Débora Isis: Uma Triste Despedida para um Caso que Parou a Cidade de Rio Largo
Na manhã de ontem (15), antes de, enfim, sepultar a filha, a dona de casa Teresa Cristina fez um pedido, que, segundo ela, era o desejo de Débora Isis. A jovem queria ser uma artista gospel conhecida nacionalmente e conhecer a cantora Aline Barros. Ela contou que a filha cantava na igreja e tinha sonho de gravar um CD com músicas gospel.
A mãe voltou a acusar a equipe médica que atestou o falecimento, e anunciou um protesto para cobrar punição aos culpados, a ser realizado nesta quinta-feira (16). Diga-se de passagem, Teresa ainda não acredita no texto preliminar do Instituto Médico Legal (IML) de Maceió, que atestou que a jovem havia falecido no domingo. Lembrando que o laudo completo deve sair somente na semana que vem ou na semana seguinte.
De acordo com a TV Gazeta, Teresa sustentaria seus sete filhos apenas com dinheiro proveniente do Bolsa Família, que receberia mensalmente do governo federal, e ainda por cima viveria de favor em uma casa emprestada no centro da cidade.
"Ela morreu aqui em casa no caixão. Quando eu estava cuidando dela na segunda a vi mexendo os olhos. Ela morreu ontem por conta daqueles algodões que colocaram em todas as partes do corpo dela. Foi negligência", disse a irmã Marta Regina, em um discurso semelhante ao da mãe.
Confira também uma reportagem realizada pelo AL TV 1ª Edição, que foi exibida no início da tarde de ontem (15), pela TV Gazeta, através de um canal de terceiros, no YouTube:
Os vizinhos da família, que acompanharam o drama dos últimos dias, relataram que Débora já vinha com sintomas de fraqueza profunda, provocada por uma falta de apetite crônica. Definhava a cada dia. Mesmo assim, alguns demoraram a acreditar que a jovem realmente tinha morrido.
"A gente que estava aqui todos os dias ficou chocado, porque não sentia mau cheiro. A Débora não parecia estar morta. Foi um grande sofrimento a esta família que já sofre tanto no dia a dia", relatou Maria de Lourdes Soares, uma das vizinhas.
De qualquer forma, o corpo de Débora Isis foi sepultado no fim da manhã de ontem, no Cemitério São José, no povoado Cachoeira, em Rio Largo. O enterro foi acompanhado por poucas pessoas, parentes e amigos da família. Diferente da multidão de curiosos, que estiveram na casa da família da jovem na manhã de terça-feira (14).
De qualquer forma, o corpo de Débora Isis foi sepultado no fim da manhã de ontem, no Cemitério São José, no povoado Cachoeira, em Rio Largo. |
Foto mostrando a entrada do Cemitério São José, no povoado Cachoeira, em Rio Largo. |
Funcionários do Cemitério São José preparando o que viria a ser o último local de descanso do corpo da jovem Débora Isis. |
O enterro foi acompanhado por poucas pessoas, parentes e amigos da família. Algo bem diferente da multidão de curiosos, que estiveram na casa da família da jovem na manhã de terça-feira (14). |
"Porque eu sei que o meu Deus não deixou você sofrer e te tirou do sofrimento. Porque se fosse da vontade do meu Deus, você teria se levantado desse caixão ontem. Mesmo assim, imprudência de médico não pode acontecer com mais ninguém. Todo ser humano que o coração ainda bate e que tem consciência tem o direito de viver", disse Teresa.
Confira também um trecho desse discurso que foi gravado pelo Portal TNH1, e publicado em um canal de terceiros, no YouTube:
Enfim, para finalizar essa matéria, nada melhor do que explicar um pouco sobre o que é a tal catalepsia que foi tão comentada nos últimos dias na cidade de Rio Largo e região.
O que é Catalepsia? A Morte de Débora Isis Teria Sido Atestada de Maneira Equivocada?
De acordo com um texto publicado, no site da Revista Superinteressante, a catalepsia é basicamente um distúrbio que impede o doente de se movimentar, apesar de continuarem funcionando os sentidos e as funções vitais (só um pouco desaceleradas). Na época da publicação do texto, Ivan Izquierdo, neurologista e professor emérito da da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) chegou a dizer que a pessoa ficava parecendo uma estátua de cera. Se ela estivesse sentada e alguém posicionasse seu braço para cima, assim permaneceria enquanto durasse o surto (muito embora algumas fontes citem que os músculos fiquem mais ou menos enrijecidos).
O ataque cataléptico poderia durar de minutos a alguns dias, e o que mais aflige quem sofre da doença é ver e ouvir tudo o que acontece em volta, sem poder reagir fisicamente. As causas, porém, ainda são um mistério para a Ciência, apesar de não faltarem hipóteses e especulações.
"A origem do problema pode ser tanto externa, assim como um traumatismo craniano, quanto congênita, uma má formação em alguma região cerebral", disse o neurologista Vanderlei Cerqueira Lima, que ainda pertence ao Hospital Albert Einstein, na cidade de São Paulo.
Ainda de acordo com o texto, todo mundo já teria ouvido lendas tenebrosas sobre pessoas que teriam sido dadas como mortas e enterradas vivas durante um surto de catalepsia, mas atualmente isso seria altamente improvável. "Se, de fato, ocorreu algo parecido, só pode ter sido em um passado muito remoto. Hoje em dia existem exames e equipamentos que confirmam o óbito sem margem de dúvida", disse o neurologista Vanderlei Cerqueira Lima.
Aparentemente, Débora Isis já vinha com um quadro de saúde debilitante há um bom tempo, ou seja, o que vimos não aconteceu da noite para o dia, sendo que os espasmos e todos os "indícios de vida" citados pela família são, na verdade, características típicas de um corpo, que já se encontra sem vida. Nesse sentido, o laudo preliminar do IML também apontou que Débora teria morrido no domingo. Agora, se houve qualquer tipo de negligência ou descaso no atendimento em qualquer unidade de saúde em que Débora passou, aí é uma outra história e será necessário um laudo mais detalhado do IML, e uma investigação rigorosa por parte da Polícia Civil. De qualquer forma, toda essa história fará parte dos meus comentários finais.
Comentários Finais
Como dizer para uma mãe de sete filhos, que sustenta sua família com o dinheiro proveniente de um programa social do governo federal e que vive de favor, em uma casa emprestada, que sua filha está morta após passar, no mínimo, por três unidades de saúde sendo que o primeiro diagnóstico fornecido foi uma mera virose? Aliás, como dizer para qualquer mãe, com mais ou menos filhos, com maior ou menor renda, que more no Norte ou no Sul, mas que tenha passado por três unidades de saúde, que nunca mais verá sua filha? A raiz do problema é muito mais profunda do que aquilo que está escrito em uma carteira de identidade, de trabalho ou das cicatrizes carregadas ao longo de uma vida. No geral, o sistema de saúde pública brasileiro e de países igualmente subdesenvolvidos ou "em desenvolvimento" (um belo eufemismo diante do caos em que vivemos) é totalmente precário: falta material hospitalar, faltam leitos, faltam bons salários, faltam profissionais, falta qualificação profissional, e tem tanta coisa que falta, que preencheria todo esse comentário final. Sobram consultas de 60 segundos ou menos, sobram dianósticos de viroses, sobram soros como paliativo para tratar toda e qualquer doença e, acima de tudo, sobra a total indiferença a vida humana. Quem em sã consciência consegue culpar aquela mãe por acreditar, que o sistema de saúde de sua cidade ou Estado falhou com sua família, e que sua filha poderia estar viva? Será que Débora realmente tinha apenas uma virose? Será que que um diagnóstico errado ou a falta de um tratamento adequado não foram as reais causas de sua morte?
Estivemos diante de um caso em que vimos autoridades com camisas sociais e engravatadas, e uma senhora humilde com uma camiseta da maior rede de varejo óptico nacional. Esses são dois mundos completamente diferentes. Verdade seja dita, diante do que é possível ver nas imagens, as autoridades agiram de uma forma rápida e correta, mas ainda assim é simbólico notar o quão o olhar de Teresa demonstrava desconfiança, impotência e principalmente medo. Teresa estava apavorada. Teresa queria acreditar em algo, queria se agarrar em algo, queria ter a certeza que, por mais surreal que pudesse ser, que a morte de sua filha não tinha sido sua culpa ou da sua condição financeira. Houve uma foto, publicada no site da TV Gazeta, que traduz outro momento simbólico desse caso. Em primeiro plano podemos ver o perito Kleber Santos esclarecendo o caso, ou seja, descartando catalepsia e, ao fundo, vemos Teresa com as duas mãos unidas na frente do seu rosto, como se estivesse rezando para que os médicos estivessem errados. São cenas assim que dão uma real dimensão do problema que está sendo enfrentado. Antes dessa cena, no entanto, familiares e amigos fizeram uma vigília em torno do corpo de Débora, pressionaram os músculos de suas mãos, que prontamente reagiram com espasmos, e que foram interpretados imediatamente como um sinal divino. Interpretaram também cada detalhe, cada movimento de despedida do corpo físico de Débora como se fosse um sinal esperança, chegando ao ponto de acreditarem que Débora iria se levantar, e que isso seria um sinal da existência de Deus. Ao final de todo esse doloroso processo, apenas duas coisas eram certas: Teresa estava exausta e sua filha estava morta.
Existem númeras lacunas que não foram preenchidas, visto não sabemos o verdadeiro histórico médico de Débora, quais problemas de saúde que ela tinha, e que nunca foram diagnosticados ou tratados corretamente, se a medicação ingerida causou algum efeito colateral, que agravou o quadro geral de sua saúde e, principalmente, se ela utilizou algum "remédio caseiro" durante o período de tratamento, o que não é incomum de acontecer em casos semelhantes. Apesar de todas essas lacunas, e de tudo que aconteceu na última terça-feira, é emblemático notar que praticamente ninguém, exceto familiares e amigos, se importou em comparecer no dia seguinte para prestar solidariedade a família, levar um prato de comida, e nem mesmo um pão ou um café. Na frente da casa de Teresa não havia ninguém. A rua estava vazia, silenciosa, não havia populares clamando por justiça, não havia moradores locais querendo ver o corpo de Débora se decompondo e não havia pessoas de outras cidades, que se deslocaram quilômetros para ver a principal atração de Rio Largo. Não havia nada. Os sites de notícias, que povoaram suas páginas com atualizações se silenciaram e, inclusive, a reportagem do AL TV conseguiu ter a coragem de encerrar com Teresa aos prantos, enquanto funcionários do cemitério jogavam pás de terra sobre o caixão de sua filha. Foi triste ver a reação de muitas pessoas, que nunca compartilharam da dor daquela mãe, mas que estavam munidos de seus celulares, esperando que Débora se levantasse e que, talvez, rendesse um vídeo para ser publicado no YouTube ou compartilhado no WhatsApp, fazendo com que sua "virose" viralizasse. Não houve um único abraço. Isso me faz pensar, que realmente, pouco a pouco, estejamos realmente sendo infectados, pelo silencioso e mortal vírus do descaso.
Até a próxima, AssombradOs.
Criação/Tradução/Adaptação: Marco Faustino
Fontes:
http://gazetaweb.globo.com/portal/noticia/2017/11/_44014.php
http://gazetaweb.globo.com/portal/noticia/2017/11/_44028.php
http://gazetaweb.globo.com/portal/noticia/2017/11/corpo-de-jovem-dada-como-morta-em-rio-largo-e-levado-ao-svo-para-avaliacao_43967.php
http://gazetaweb.globo.com/portal/noticia/2017/11/familia-acusa-hospital-particular-de-negligencia-ao-atestar-morte-de-debora-isis_43995.php
http://gazetaweb.globo.com/portal/noticia/2017/11/perito-descarta-catalepsia-e-afirma-que-jovem-apresenta-sinais-de-morte_43981.php
http://gazetaweb.globo.com/portal/noticia/2017/11/texto-preliminar-laudo-iml-morte-de-menina-rio-largo_43999.php
http://www.cadaminuto.com.br/noticia/312717/2017/11/15/corpo-de-debora-isis-sera-enterrado-nesta-quarta-feira
http://www.tnh1.com.br/noticias/noticias-detalhe/alagoas/corpo-de-garota-dada-como-morta-e-encaminhado-ao-svo-para-ser-examinado/?cHash=91347cabe24c215fbcf6de7bcb56a63b
http://www.tnh1.com.br/noticias/noticias-detalhe/alagoas/video-corpo-de-debora-isis-e-sepultado-em-cemiterio-com-cerimonia-simples/?cHash=961e3e7413a9595104256ad6ab0f7f17
http://www.tnh1.com.br/noticias/noticias-detalhe/geral/legista-explica-estranho-caso-da-menina-dada-como-morta-em-de-rio-largo/?cHash=b2076e7ffc19072f8196d4edcec158e4
http://www.tnh1.com.br/tnh1-tv/canal/cidade-alerta-alagoas/single/video/iml-de-maceio-confirmou-morte-da-jovem-debora-isis-1/?cHash=cb3afb83854dd35730a10909c984a816
https://cidadeverde.com/noticias/260231/familia-se-nega-a-enterrar-jovem-declarada-morta-ha-dois-dias-ela-se-mexeu
https://extra.globo.com/casos-de-policia/familia-se-nega-enterrar-jovem-declarada-morta-ha-dois-dias-ela-se-mexeu-22069773.html
https://g1.globo.com/al/alagoas/noticia/iml-de-maceio-confirma-morte-de-jovem-que-mae-se-negava-a-enterrar-por-crer-que-ainda-estava-viva.ghtml
https://g1.globo.com/al/alagoas/noticia/jovem-morta-que-familia-alegava-estar-viva-e-enterrada-em-rio-largo.ghtml
https://g1.globo.com/al/alagoas/noticia/mae-diz-que-vai-aceitar-se-iml-de-maceio-atestar-morte-da-filha-enterra-e-pronto.ghtml
https://g1.globo.com/al/alagoas/noticia/mae-se-nega-a-enterrar-filha-declarada-morta-por-acreditar-que-ela-ainda-esteja-viva.ghtml