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O Caso Vilma Trujillo: Mulher é Queimada em uma Fogueira Por Estar Supostamente "Possuída pelo Demônio" em Rosita, na Nicarágua

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Por Marco Faustino

Supostos casos de possessões demoníacas são relativamente comuns na América Latina e Central, razão pela qual evito de abordar a maior parte dos casos, e trazendo apenas aqueles de maior relevância ou que possa agregar substancialmente algum conhecimento ou informação para vocês, nossos leitores. Esse foi o caso, por exemplo, daquele recente incidente envolvendo dezenas de alunos do Instituto Educacional Agroecológico Atrato, na cidade de Lloró, na Colômbia. Na época, grande parte das autoridades locais divulgaram que os adolescentes, entre 12 e 18 anos, em sua absoluta maioria meninas, estariam sofrendo de uma "possessão diabólica", visto que estariam convulsionando, falando com vozes estranhas e chamando a si próprios de "demônios". O centro de saúde da comunidade e duas igrejas (uma católica e outra evangélica) prestaram auxílio através de orações, e os adolescentes estavam sendo tratados apenas com a administração de soro. Também foi mencionado que tudo teria acontecido, quando diversos alunos começaram a usar uma tábua Ouija, em uma das salas do instituto educacional, porém outras versões apontavam que teria sido desencadeado por um aplicativo de celular, que simulava a tábua Ouija. No total, foram mais de 40 casos, o que causou pânico entre os moradores locais. De qualquer forma, fizemos uma postagem bem completa para mostrar a realidade por trás daquele assunto, visto que casos assim raramente acontecem de forma aleatória. Vale muito a pena conferir, acreditem (leia mais: "Possessão Demoníaca"? Alunos Dizem que um "Demônio Queria Arrancar Suas Almas" Após Usarem a Tábua Ouija, na Colômbia!).

Entretanto, o caso que vamos tratar nessa postagem, que ocorreu no fim do mês passado, é um exemplo clássico de como um entendimento completamente distorcido e errado do comportamento humano pode resultar em uma tragédia, cuja brutalidade chega a ser inexplicável do ponto de vista moral, ético e religioso. Esse é um caso envolvendo uma mulher chamada Vilma Trujillo García, 25 anos, moradora da comunidade de Cortezal, na cidade de Rosita, na Nicarágua, que foi morta ao ser colocada para arder em chamas em uma fogueira, ainda viva, e posteriormente jogada de um barranco, fazendo com que sua chances de viver estivessem a mercê da própria sorte. Tudo isso porque alguém teve o que estão chamando de "revelação divina", e que Deus teria ordenado ou sugerido que o caso fosse "tratado com fogo". Parentes de Vilma Trujillo a encontraram horas mais tarde, com queimaduras de terceiro grau em 80% do corpo, sendo que a mesma demorou mais de 30h para chegar até um hospital de Manágua, capital do país, para então ser finalmente atendida de forma adequada. Vilma acabou morrendo pouco tempo depois devido a falência múltipla de órgãos, e deixou dois filhos, um menino de cinco anos e uma menina de apenas dois. Sua morte acabou sendo atribuída a grupo de pessoas, pretensamente religiosos, que decidiram que tinham autonomia para representar uma divindade, tal como Deus é para os católicos, diversas outras denominações evangélicas e protestantes, e tantos outros movimentos religiosos.

Na Nicarágua, essa era uma tragédia praticamente anunciada. No dia 26 de janeiro desse ano, pouco menos de um mês até a morte de Vilma Trujillo, o site nicaraguense do jornal "El Nuevo Diario" publicou que segundo um estudo apresentado naquela mesma data, pelo Instituto de Medicina Legal da Nicarágua, cerca de 60% das vítimas atendidas no IML eram mulheres. De acordo com Zacarías Duarte, diretor do instituto, a principal vítima de violência na Nicarágua continuava sendo a mulher, ou seja, isso era uma constante ao longo dos últimos anos. Ao menos 49 mulheres teriam sido vítimas de "feminicídio" em 2016, quatro a menos que ano anterior. Vale ressaltar que "feminicídio" seria o assassinato de uma mulher simplesmente por ser mulher. As motivações mais usuais seriam o ódio, o desprezo ou o sentimento de perda do controle e da propriedade sobre as mulheres. Entre essas mortes estava a de quatro adolescentes entre 13 e 17 anos, que teriam sido violentadas antes de serem assassinadas. Os maiores índices estavam na Região Autônoma da Costa Sul do Caribe (RACCS) e na Região Autônoma da Costa Norte do Caribe (RACCN), que juntas representavam cerca de 20 das 49 mortes (a cidade de Rosita pertence justamente a RACCN). Porém, ao acessar sites de notícias nicaraguenses pude perceber a grande violência, e talvez até mesmo mais mórbida e cruel (se é que tenho competência para avaliar isso) de diversos casos que não ganharam a mesma repercussão que a morte de Vilma Trujillo. Assim sendo, pesquisei um pouco mais a fundo para trazer todos os detalhes que fizeram desse caso ser tão amplamente divulgado. Vamos saber mais sobre esse assunto?

Um Pouco Sobre o Município de Rosita, na Nicarágua


Rosita é um município da Região Autônoma da Costa Norte do Caribe (abreviada como RACCN, e anteriormente chamada de Região Autônoma do Atlântico Norte, RAAN), que por sua vez é uma das regiões autônomas da Nicarágua, cuja capital é Puerto Cabezas. De acordo com o último censo realizado em 2005, Rosita tinha pouco mais de 22 mil habitantes, porém apenas 8.500 viviam no meio urbano, ou seja, é uma localidade predominante rural. Para vocês terem uma ideia, o município possui cerca de 11 bairros no meio urbano, e 81 comunidades no meio rural.

De acordo com o último censo realizado em 2005, Rosita tinha pouco mais de 22 mil habitantes, porém apenas 8.500 viviam no meio urbano, ou seja, é uma localidade predominante rural
Para vocês terem uma ideia, o município possui cerca de 11 bairros no meio urbano, e 81 comunidades no meio rural
A cidade de Rosita está localizada a 141 km de distância de Puerto Cabezas (aproximadamente 4h de viagem utilizando um carro), e encontra-se praticamente "isolada" em meio a duas reservas ambientais. Por outro lado, a cidade está localizada a 380 km de Manágua, a capital do país (uma viagem que pode demorar entre 9 e 11 horas de carro, dependendo do trajeto escolhido).

A cidade de Rosita está localizada a 141 km de distância de Puerto Cabezas (aproximadamente 4h de viagem utilizando um carro), e encontra-se praticamente "isolada" em meio a duas reservas ambientais
Por outro lado, a cidade está localizada a 380 km de Manágua, a capital do país
(uma viagem que pode demorar entre 9 e 11 horas de carro, dependendo do trajeto escolhido)
Apesar da cidade possuir um clima subtropical bem úmido, com precipitações anuais que variam entre 1.900 e 3.290 mm, o solo é bem pobre. Assim sendo, uma vez que sua principal atividade econômica é a agricultura, o índice de desemprego na cidade é alarmante, chegando a casa dos 80% da população.

Querem conhecer mais detalhes sobre a cidade de Rosita? Bem, vocês pode fazer uma espécie de passeio pelas ruas da cidade, através de um vídeo postado em um canal de terceiros, em julho de 2012, no YouTube:



Nem sempre foi assim, é claro. A cidade, anteriormente conhecida como Santa Rita, cresceu muito na década de 1940, quando ocorreu uma intensa exploração mineira por parte da Rosario Mining Company.

Explorações realizadas entre 1951 e 1955 levaram à descoberta e extração de cobre, que deixou de ser extraído em 1975, justamente pela queda do preço do metal. Após a mina ter sido "nacionalizada" em 1979, a mesma acabou sendo abandonada, e completamente desmantelada em 1982. Pelo menos essa é versão sobre a exploração mineira na cidade, que existe disponível na Wikipedia.

Visão panorâmica da antiga mina da Rosario Mining Company, em Rosita, na Nicarágua
Entretanto, o que geralmente não contam para vocês, é que desde o início do século 20 já eram realizados estudos sobre a presença de ouro nessa região, porém a Nicarágua não tinha a menor condição de extrair e processar o minério, precisando assim atrair capital estrangeiro, algo que aconteceu somente na década de 1940. Diversas companhias de mineração atuaram no local (devido aquisição da companhia anterior e assim por diante) e, em 1975, houve uma interrupção temporária devido a desvalorização do ouro e do cobre.

Em 1979, no entanto, todas as minas do pais foram "nacionalizadas" devido a Revolução Sandinista, ocorrida na Nicarágua entre 1979 e 1990, sob a égide da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) - assim chamada em memória ao líder de esquerda Augusto César Sandino, que depôs o então presidente Anastasio Somoza Debayle.

Em 1979, no entanto, todas as minas do pais foram "nacionalizadas" devido a Revolução Sandinista, ocorrida na Nicarágua entre 1979 e 1990, sob a égide da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN)
Uma vez que esse movimento foi apoiado por Cuba e a antiga União Soviética, vocês devem imaginar que isso não deu muito certo, e o resultado foi caótico para a região onde Rosita se encontra. Ocorreu uma profunda mudança demográfica, principalmente em termos étnicos, além da destruição de ricas florestas tropicais devido a exploração madeireira, e a utilização de terras agrícolas abandonadas para pastagem.

Para piorar a situação, uma vez que a "guerra" tinha acabado, houve a desmobilização do exército, o que aumentou consideravelmente o número de desempregados. Ex-combatentes passaram a exigir terras, bens, compensações financeiras devido a guerra etc. Havia muita gente inconformada em um mesmo local, e aconteceram algumas revoltas que acabaram sendo sufocadas. Apesar da relativa estabilidade que a localidade vem vivenciando desde 1990, o clima sócioeconômico, por assim dizer, nunca foi bom em Rosita.

Apesar da relativa estabilidade que a localidade vem vivenciando desde 1990,
o clima sócioeconômico, por assim dizer, nunca foi bom em Rosita
Enfim, conforme vocês puderam perceber, o histórico da região e do próprio país pesa muito contra a cidade de Rosita. Logicamente, estamos mostrando essa situação de forma bem resumida e simplificada. De qualquer forma, talvez tudo isso (desde a febre do ouro e do cobre até os desdobramentos da Revolução Sandinista) explique um pouco a situação precária em que vive a maior parte da população da cidade. Vale ressaltar nesse ponto que, assim como boa parte da Nicarágua, a cidade de Rosita (como não podia deixar de ser) é multiétnica (composta por sumus, miskitos, crioulos e mestiços). Cada grupo étnico tem suas próprias festas, que são realizadas principalmente nas comunidades rurais, mantendo os costumes de seus antepassados. Resumindo, querendo ou não é um ambiente "cultural" bem instável.

O Caso Vilma Trujillo: Como Tudo Começou a ser Noticiado pela Mídia Nicaraguense


No dia 25 de fevereiro desse ano, foi publicada uma estranha notícia no site do jornal nicaraguense chamado "La Prensa", intitulada: "Lanzan a una mujer a una hoguera para 'liberarla del demonio' en el Caribe Norte" ("Atiram uma mulher em uma fogueira para 'libertá-la do demônio' na Costa Norte do Caribe", em adaptação ao português).

Essa notícia dizia que, uma jovem chamada Vilma Trujillo García, 25 anos, moradora da comarca de Cortezal, uma comunidade do município de Rosita (localizada a 110 km do meio urbano de Rosita), estava com 80% do seu corpo queimado, por ter sido supostamente atirada em uma fogueira para libertá-la do demônio. Aliás, essa informação tinha sido fornecida por um pastor de uma determinada igreja evangélica de Rosita, chamado Sabas Calderón Tobares, no qual uma tia da jovem lhe contou detalhes sobre o ocorrido.

Uma das poucas fotos de Vilma Trujillo García, 25 anos, moradora da comarca de Cortezal,
uma comunidade do município de Rosita (localizada a 110 km do meio urbano de Rosita)
De acordo com Sabas, a tia da jovem teria contado que eles acreditavam que a Vilma Trujillo estava endemoniada, uma vez que ela teria tentado agredir os membros da igreja da comunidade de Cortezal com uma machete (uma espécie de facão utilizado em acampamentos, caça, pesca etc.). Uma das mulheres, membro da congregação da igreja, teria dito ao pastor Juan Rocha, que Deus teria lhe revelado que, para purificar e expulsar o demônio de Vilma, a mesma deveria ser lançada ao fogo. O religioso acrescentou que alguns líderes da igreja da comunidade de Suklin Tingni teriam ido até a comunidade de Cortezal para realizar investigações, e determinar se havia ou não a participação do pastor da referida igreja, o Juan Rocha, porque não sabiam se tinha sido a congregação ou o próprio pastor que tinha praticado tal ato.

Se as investigações apontassem a participação do pastor, uma das medidas que seriam tomadas era a sua expulsão da congregação. Segundo Sabas, essas práticas não existiam dentro da igreja. Ele também disse que houvesse o envolvimento do pastor, o mesmo deveria ser responsabilizado judicialmente, mas insistiu que as pessoas esperassem pelas investigações, visto que para chegar até a localidade seriam necessárias 12 horas de viagem.

Vilma Trujillo García foi atendida no Hospital Rosario Pravia Medina, na cidade de Rosita. Ela tinha dado entrada no hospital no dia 22 de fevereiro, uma quarta-feira, cerca de 30 horas após ter sido queimada. O Dr. David Saravia, diretor do hospital de Rosita, disse que Vilma tinha chegado com mais de 50% do corpo queimado e com quadro de desidratação.

Vilma Trujillo García foi atendida no Hospital Rosario Pravia Medina, na cidade de Rosita. Ela tinha dado entrada no hospital no dia 22 de fevereiro, uma quarta-feira, cerca de 30 horas após ter sido queimada
Ela foi atendida pela equipe do centro médico e, em seguida, foi transferida para o Hospital Lenin Fonseca, em Manágua, capital da Nicarágua, para receber atendimento especializado. Considerando, a distância de Rosita até Manágua, vocês podem imaginar o quanto Vilma sofreu (apesar de ter sido transferida de avião a partir de uma cidade relativamente "próxima"). A polícia, no entanto, ainda não havia se pronunciado sobre o caso.

Ela foi atendida pela equipe do centro médico e, em seguida, foi transferida para o Hospital Lenin Fonseca, em Manágua, capital da Nicarágua, para receber atendimento especializado
Considerando, a distância de Rosita até Manágua, vocês podem imaginar o quanto Vilma sofreu (apesar de ter sido transferida de avião a partir de uma cidade relativamente "próxima")
Cerca de dois dias depois (27), uma outra notícia publicada no site "La Prensa" começava a rascunhar um verdadeiro cenário de terror, visto que Vilma Trujillo estaria amarrada e nua no momento que o pastor Juan Gregorio Rocha Romero dizia que a mesma estava endemoniada, que iria libertá-la do demônio, e posteriormente teria a jogado na fogueira. Na época, Vilma estava em coma, e havia uma nova informação: cerca de 80% do seu corpo estava queimado.

Foto do Hospital Lenin Fonseca, em Manágua, capital da Nicarágua
Além disso, o pastor não cometeu aquele ato bárbaro sozinho, visto que quatro outras pessoas o teriam ajudado. Todos eram membros da igreja Assembleia de Deus, localizada na comunidade de Cortezal, que pertence ao município de Rosita, na Região Autônoma da Costa Norte do Caribe Costa (RACCN). Para Reynaldo Peralta Rodriguez, 35 anos, marido de Vilma, no entanto, essa atitude era imperdoável e dolorosa, uma vez que sua esposa não estava endemoniada.

"Minha esposa passou oito dias trancafiada nessa congregação, e disseram a irmã de Vilma, que estava no local, que para queimá-la. Eles juntaram alguns pedaços de lenha, a amarraram ao redor do fogo e, em seguida, a empurrram, nua", disse Reynaldo Peralta.

"No hospital me disseram que falta pouco para ela morrer. Ela entrou em coma e, além disso, me disseram que um rim e o fígado 'cozinharam', e por isso ela não vai sobreviver, mesmo que a operem", continuou. Vilma encontrava-se internada desde o dia 23 de fevereiro, no Hospital Lenin Fonseca, em Manágua. Sim, exatamente isso que vocês leram, disseram ao marido que um rim e um fígado de Vilma teria sido literalmente "cozidos".

Para Reynaldo Peralta Rodriguez (na foto), 35 anos, marido de Vilma, no entanto, essa atitude era imperdoável e dolorosa, uma vez que sua esposa não estava endemoniada.
A última vez que Reynaldo Peralta viu sua esposa teria sido no dia 3 de fevereiro (guardem bem essa informação). Nesse dia ele se despediu dela, porque viajaria para San Miguel de Casa de Alto, em La Cruz de Río Grande, na Região Autônoma da Costa Sul do Caribe (RACCS), para trabalhar na fazenda de sua mãe, e aproveitar como construir uma casa para ele, Vilma e os dois filhos do casal. Foram 14 dias que ele passou sem a sua esposa, sem imaginar a tragédia que aconteceria com ela.

"Para mim, minha mulher não estava endemoniada, o que fizeram com ela foi bruxaria, porque ela tomava um remédio, devido a um homem, que só agora a família de Vilma me contou que a tinha estuprado, e desde que ela começou a tomar o remédio, ela mudou um pouco comigo", explicou. Ao ser questionado se em algum momento Vilma falou com ele sobre esse estupro, Reynaldo disse que ela nunca comentou sobre o assunto.

"Quando fiquei sabendo do estupro, fui até o homem que se chama Roberto e falei com ele, mas não o enfrentei porque ele estava armado com um rifle", completou Reynaldo, que sua vez disse não lembrar do sobrenome do suposto estuprador.

Imagem do Google Maps mostrando a distância entre as cidades de Rosita e La Cruz de Rio Grande
A última vez que Reynaldo Peralta viu sua esposa teria sido no dia 3 de fevereiro (guardem bem essa informação). Nesse dia ele se despediu dela, porque viajaria para San Miguel de Casa de Alto, em La Cruz de Río Grande, na Região Autônoma da Costa Sul do Caribe (RACCS), para trabalhar na fazenda de sua mãe, e aproveitar como construir uma casa para ele, Vilma e os dois filhos do casal
De qualquer forma, o pastor Juan Gregorio Rocha Romero, 23 anos, tinha sido preso pela polícia de Rosita na sexta-feira anterior (24), juntamente com aquelas outras quatro pessoas que estavam sendo acusadas de jogar Vilma em uma fogueira. Essa informação tinha sido confirmada por Marvin, um irmão dos quatro que a vítima possuía. Esses quatro irmãos se encontravam em Rosita, e alegaram que estavam sendo ameaçados pelos familiares do pastor Juan Rocha.

Marvin Trujillo García estava acompanhado de Emilio Rivas, um padre da Igreja Católica de Rosita. Emilio comentou que o caso havia surpreendido a todos, uma vez que atentava contra a vida. Por mais incrível que pareça, as autoridades policiais ainda não tinham se pronunciado, mas os irmãos da vítimas disseram que haveria uma audiência na cidade de Siuna (uma cidade localizada a 72 km a sudoeste de Rosita), naquele mesmo dia (27), contra o pastor e os quatro membros da congregação, que estavam envolvidos nessa história.

Emilio Rivas (à direita), um padre da Igreja Católica de Rosita.
Emilio comentou que o caso havia surpreendido a todos, uma vez que atentava contra a vida
"O ser humano tem a capacidade de discernir e interpretar, quando uma pessoa está doente, seja espiritualmente ou fisicamente; quando nos envolvemos com fanatismos, e vemos o demônio em tudo, não dá certo. Nesse caso, a senhora Vilma Trujillo tinha uma doença psicológica, e precisava ter sido encaminhada para um hospital", disse o padre Emilio Rivas.

A Morte de Vilma Trujillo e a Repercussão do Caso Envolvendo a Sua Morte


No dia seguinte (28), uma terça-feira, o site "La Prensa" noticiou que Vilma Trujillo García hava falecido durante a madrugada, por volta das 4h22 da manhã, na UTI do Hospital Antonio Lenin Fonseca, em Manágua. O IML entregou o corpo de Vilma, na tarde daquele mesmo dia, para seu marido, o Reynaldo, que juntamente com Juan Ramon Espinoza, um amigo da falecida, o transladou na traseira de uma caminhonete até a cidade de Cruz de Rio Grande, onde moram seus familiares. Vilma morreu devido as graves queimaduras de terceiro grau, que deram origem a infecções, e que resultaram em falência múltipla de órgãos, uma vez que os rins e o fígado tinham sido severamente comprometidos.

O IML entregou o corpo de Vilma, na tarde daquele mesmo dia, para seu marido, o Reynaldo, que juntamente com Juan Ramon Espinoza, um amigo da falecida, o transladou na traseira de uma caminhonete até a cidade de Cruz de Rio Grande, onde moram seus familiares
Vilma morreu devido as graves queimaduras de terceiro grau, que deram origem a infecções, e que resultaram em falência múltipla de órgãos, uma vez que os rins e o fígado tinham sido severamente comprometidos
A pior parte é que o "La Prensa" começou a divulgar mais detalhes sobre o perverso ato cometido contra Vilma. A jovem de 25 anos teria permanecido pouco mais de nove horas em um barranco, às margens de um rio, na periferia da comunidade de Cortezal, com seu corpo amarrado e queimado. Pelo menos essa era a história de uma adolescente de apenas 15 anos, irmã da vítima, que foi a primeira a chegar no local onde alguém da comunidade avisou que eles estavam queimando a Vilma.

Sinceramente, não consigo imaginar uma situação como essa. Na prática, além de queimarem a jovem, o pastor e membros de sua congregação a jogaram de um barranco a deixando a mercê da própria sorte.

Foto de Juan Ramon Espinoza, um amigo da falecida
Miurel Gutiérrez, membro da Rede de Mulheres Contra a Violência, que por sua vez é uma organização sem fins lucrativos nicaraguense, disse que vinha prestando ajuda a família da vítima, principalmente "atendimento psicológico alternativo" a adolescente, que ficou traumatizada devido ao choque de ter visto sua irmã jogada naquelas condições. Segundo Miurel, a comunidade de Cortezal ficava a cerca de 8h de distância do meio urbano de Rosita, o que agravou ainda mais a questão do atendimento à Vilma. Confira um vídeo sobre a morte de Vilma, que foi publicado pelo canal do "El Nuevo Diario", no YouTube, no dia 28 de fevereiro:



"As autoridades devem aplicar todo o peso da lei, para que essas pessoas que cometeram esse ato criminoso sirvam de exemplo para que tais atos como esse não sejam permitidos", disse Pablo Cuevas, consultor jurídico da Comissão Permanente de Direitos Humanos (CPDH).

"É inacreditável que aconteçam essas coisas hoje em dia, deve haver uma avaliação por parte das autoridades em relação as diferentes denominações religiosas. Não é possível que ocorram casos assim. A anarquia prevalece quando não há uma presença institucional eficaz. É amplamente conhecido, que existem regiões do paí,  onde as pessoas fazem justiça com suas próprias mãos ou tomam atitudes anárquicas, visto que não há presença institucional do Estado", continuou Pablo Cuevas. Ainda segundo ele, os acusados poderiam responder por diversos crimes, incluindo tentativa de homicídio e lesão corporal grave, assim como em relação aos danos de ordem psicológica.

Pablo Cuevas, consultor jurídico da Comissão Permanente de Direitos Humanos (CPDH)
Para Juanita Jiménez, líder do Movimento Autônomo das Mulheres (MAM), o caso de Vilma era fruto do fanatismo e da misoginia (repulsa, desprezo ou ódio contra as mulheres), mas também coincidia com a declaração de Pablo Cuevas em ser um produto da negligência e do abandono institucional em que vivem os habitantes das regiões mais remotas do país.

"Independentemente da religiosidade, nada justifica um ato de crueldade tal como queimar essa mulher, a colocando em uma fogueira, e com a participação de outras pessoas em uma verdadeira manipulação religiosa. Uma combinação atroz que fere os direitos das mulheres", disse Juanita Jiménez, acrescentando que o fato demonstrava a vulnerabilidade das mulheres em suas comunidades e dentro de suas casas. Para ela o crime era uma "tentativa de feminicídio", porque havia a clara intenção de causar danos a Vilma.

Para Juanita Jiménez (na foto), líder do Movimento Autônomo das Mulheres (MAM), o caso de Vilma era fruto do fanatismo e da misoginia (repulsa, desprezo ou ódio contra as mulheres), mas também coincidia com a declaração de Pablo Cuevas em ser um produto da negligência e do abandono institucional em que vivem os habitantes das regiões mais remotas do país.
O pastor Augusto Marenco, que pertencia às Assembleias de Deus, e que recentemente havia passado a ser pastor do Ministério Apostolar Centro Cristiano, qualificou esse fato como um "desvio de conduta" por parte do pastor e dos outros membros que participaram do crime. Ele também mencionou que todas as denominações evangélicas mantinham a mesma linha em relação a formação doutrinária.

"Primeiramente, um pastor de qualquer denominação evangélica não pode fazer isso, exceto que esteja afastado dos princípios que estabelecem as normas de qualquer igreja ou denominação, especialmente os princípios estabelecidos pela Palavra de Deus", explicou Marenco.

O pastor Augusto Marenco, que pertencia às Assembleias de Deus, e que recentemente havia passado a ser pastor do Ministério Apostolar Centro Cristiano, qualificou esse fato como um "desvio de conduta" por parte do pastor e dos outros membros que participaram do crime
"De acordo com o que li, uma vez que os pastores mantêm uma rede de comunicação, a informação que obtive de outros líderes, de outras denominações (...) é que houve um desvio total em relação ao modo que essas pessoas estavam agindo", completou. Enquanto isso, o reverendo Rafael Arista, identificado como presidente das Assembleias de Deus, disse que Juan Rocha não era pastor dessa congregação, mas reconheceu que o mesmo era um leigo, que pertencia a congregação há 8 meses.

Enquanto isso, o reverendo Rafael Arista, identificado como presidente das Assembleias de Deus, disse que Juan Rocha não era pastor dessa congregação, mas reconheceu que o mesmo era um leigo, que pertencia a congregação há 8 meses
Aparentemente, seja pela distância da comunidade de Cortezal e da cidade de Rosita, em relação a Manágua, ou pelo fato que a mídia estava esperando para ver se Vilma iria mesmo morrer ou não, somente após a sua morte é que houve uma explosão de notícias em nível nacional e mundial sobre esse caso. Aliás, também havia um outro motivo pelo qual esse assunto ganhou uma dimensão bem maior que os outros casos extremamente violentos que acontecem na Nicarágua. Comentaremos sobre isso no fim dessa postagem.

O Caso Vilma Trujillo Ganha Espaço na Mídia Nicaraguense e Mundial: Pastor Alegou que "Vilma se Atirou Sozinha na Fogueira"


Naquela mesma terça-feira (28), o site do jornal "El Nuevo Diario" e da TN8 (Telenica Canal 8), uma emissora de TV da Nicarágua, praticamente começaram a fazer parte de todo um trabalho que já vinha sendo realizado pelo "La Prensa", mas não acrescentaram muita coisa ao que já sabíamos sobre o caso. A participação de ambos, no entanto, foi fundamental, visto que começaram a chegar vídeos e mais imagens sobre o caso para tentar ilustrá-lo de alguma forma, se que é as pessoas estavam realmente preparadas para ver tamanha crueldade. A mídia internacional, principalmente impulsionada por diversas agências internacionais de notícias, também passaram a cobrir o caso, porém apenas de forma bem resumida. Provavelmente, foi justamente esse "resumo" que você se deparou na semana passada.

Ainda naquela terça-feira, o "La Prensa" divulgou que o pastor Juan Gregorio Rocha Romero negou ter atirado Vilma Trujillo em uma fogueira para expulsar o "espírito maligno" que ela possuía. Ele chegou a declarar diante das câmeras, que teria sido a própria Vilma que se atirou, porque "estava endemoniada".

Juan Gregorio Rocha Romero negou ter atirado Vilma Trujillo em uma fogueira para expulsar o "espírito maligno" que ela possuía. Ele chegou a declarar diante das câmeras, que teria sido a própria Vilma que se atirou, porque "estava endemoniada"
"É que Deus disse que ia expulsar esse espírito maligo do corpo dela, e que era para fazermos uma 'fogueirinha', para que o espírito fosse expulso", disse Juan Rocha perante jornalistas locais, na cidade de Siuna, antes que ele e outras quatro pessoas fossem transferidas para serem julgadas em Manágua. Confira sua declaração em vídeo publicado pelo canal do "El Nuevo Diario", no YouTube, no dia 28 de fevereiro:



Os outros réus eram: Franklin Jarquín Hernández, 28 anos, Pedro Rocha Romero, 26 anos, Tomasa Rocha Romero, 24 anos, e Esneyda del Socorro Orozco Téllez, 25 anos, todos membros da Igreja Visão Celestial das Assembleias de Deus, na comunidade de Cortezal. No total eram 3 homens e 2 mulheres.

Juan Gregorio Rocha Romero, 23 anos, Franklin Jarquín Hernández, 28 anos e Pedro Rocha Romero, 26 anos,
foram levados em uma caminhonete de Siuna para Manágua
Tomasa Rocha Romero, 24 anos, e Esneyda del Socorro Orozco Téllez, 25 anos,
também foram transferidas em uma caminhonete separada
Juan Rocha e Franklin alegaram que ninguém tocou em Vilma Trujillo, e que "foi o demônio que saiu e ela caiu no fogo". No entanto, a investigação realizada pela Polícia Nacional indicava o contrário, apontando para os cinco mencionados acima, como sendo os responsáveis por atirar Vilma na fogueira. O pastor disse que Vilma "estava endemoniada" e, que através de uma profecia de Deus, havia sido revelado que acendessem uma "fogueirinha" para curá-la.

Quando os jornalistas perguntaram se ele já tinha feito algo semelhante, ou seja, de queimar pessoas, Juan Rocha disse: "Não, não, a questão que é não iríamos queimá-la, irmão. Ele se suspendeu e caiu no fogo. E quando estávamos orando, percebemos que ela estava em chamas".

"Deus me revelou que deveríamos fazer uma fogueira nos fundos da igreja, que um grupo de irmãos levassem a doente (nesse caso, a Vilma), que a amarrassem próxima ao fogo, e que se realizasse uma oração para que o demônio saísse de seu corpo, e fosse atirado diretamente no fogo", disse Esneyda del Socorro Orozco Téllez, durante seu depoimento a polícia.

Quando os jornalistas perguntaram se ele já tinha feito algo semelhante, ou seja, de queimar pessoas, Juan Rocha (à esquerda) disse: "Não, não, a questão que é não iríamos queimá-la, irmão. Ele se suspendeu e caiu no fogo. E quando estávamos orando, percebemos que ela estava em chamas"
O "La Prensa" teve acesso à investigação por parte da Polícia Nacional, no qual chamava a atenção que o pastor Juan Gregorio Rocha Romero chegou à casa de Vilma Trujillo para fazer uma oração de cura no dia de 15 de fevereiro, e desde essa data até o dia 21 de fevereiro, Vilma teria permanecido no interior dessa igreja em questão. Segundo a polícia, Vilma Trujillo foi amarrada pelas cinco pessoas que tinham sido detidas, porque ela estava delirando devido a sua "doença".

O pastor tinha convocado os membros da congregação para seis dias de oração para curar Vilma, e por volta de 1h da manhã, do dia 21 de fevereiro, ele tomou conhecimento da suposta revelação divina de Esneyda Téllez Orozco para curá-la através do fogo. De acordo com as investigações policiais, Tomasa Rocha Romero orientou os membros do sexo masculino a recolher lenha para fazer a fogueira na parte norte da igreja, assim como foi mencionado por Esneyda. Pedro Rocha Romero e Franklin Jarquín Hernández ficaram responsáveis em acender o fogo. O pastor teria ordenado que um grupo de pessoas permanecessem dentro da igreja, enquanto 12 pessoas, incluindo a si próprio saíram para rezar junto na "fogueira de cura".

Os acusados foram apresentados formalmente em Mánagua, capital da Nicarágua
Apenas uma das pessoas que foram convidadas a rezar disse que aquilo era perigoso, e que não deviam fazer aquilo, justamente para preservar a saúde física da jovem. No entanto, o pastor insistiu. "É uma ordem do Senhor para queimar o corpo da vítima e o espírito maligno que está dentro de Vilma Trujillo García", teria dito o pastor. A investigação também apontou, que o pastor ordenou para que fiéis fechassem os olhos, levantassem suas mãos e entoassem uma oração.

"Nesse momento, os acusados atiraram o corpo da jovem Vilma Trujillo no fogo, mas um dos fiéis identificado como Miguel Angel Zamora abriu os olhos e viu que a jovem estava deitada sobre a fogueira, razão pela qual ele resolveu tirá-la da fogo. Os demais irmãos ficaram incomodados com a situação e se retiraram da oração de cura, que terminou em tragédia", mencionou o documento produzido pela investigação policial.

Vilma Trujillo teria sido atirada na fogueira por volta das 5h30 da manhã do dia 21 de fevereiro. Conforme mencionamos anteriormente, ela permaneceu pouco mais de nove horas jogada em um barranco, às margens de um río na periferia de Cortezal, quando foi encontrada e levada ao hospital de Rosita. Porém, devido a gravidade de suas queimaduras ela foi transferida pra o Hospital Lenín Fonseca, onde acabou não resistindo.

O "La Prensa" teve acesso à investigação por parte da Polícia Nacional, no qual chamava a atenção que o pastor Juan Gregorio Rocha Romero chegou à casa de Vilma Trujillo para fazer uma oração de cura no dia de 15 de fevereiro, e desde essa data até o dia 21 de fevereiro, Vilma teria permanecido no interior dessa igreja em questão
Franklin Jarquín Hernández, um dos detidos, disse que "o demônio que havia se apoderado da mulher era o do adultério. Ela cometeu um erro e falhou perante Deus, porque ela tinha seu companheiro de vida, e cometeu um erro com outro homem. Estava se passando por cristã submetendo-se ao jejum, e acreditando que Deus havia lhe castigado dessa forma, se endemoniou. Foi um espírito que a empurrou e a fez cair no fogo". Aliás, estava previsto que os acusados fossem apresentados ao Tribunal de Audiências de Siuna, mas repentinamente os cinco acusados foram levados em duas caminhonetes da Polícia Nacional, e transferidos para Manágua, onde enfrentariam um processo judicial pelos crimes que cometeram.

O site do jornal "El Nuevo Diario" destacou que Esneyda del Socorro Orozco Téllez era mãe de três filhos pequenos, e que seu advogado, Isidro Trujillo Hernández, disse que sua cliente estava sendo acusada apenas por ter tido uma "revelação", que isso estava escrito na bíblia, mas que tinha sido uma má-interpretação, uma distorção, e que por isso ela era inocente. Confira a declaração de Isidro Hernández, em um vídeo publicado pelo canal do "El Nuevo Diario", no YouTube, no dia 28 de fevereiro:



Sinceramente, esse é caso é tão sombrio que uma mãe de três filhos pequeno foi capaz de iniciar uma verdadeira barbárie contra uma outra mãe de duas crianças. É difícil até continuar com essa história, mas vamos em frente.

A Reação do Governo, da Igreja Católica, e da Igreja Evangélica: Afinal de Contas, Juan Rocha Era ou Não um Pastor?


De acordo com uma notícia publicada pelo site do canal TN8, Rosario Murillo, Vice-Presidente da Nicarágua, condenou a morte de Vilma Trujillo, que havia falecido justamente no dia do seu discurso, às vésperas do início da Quaresma.

"Vilma Trujillo foi queimada por membros de sua comunidade, que alegaram que ela estava possuída pelo demônio. A Polícia Nacional está realizando a captura dos responsáveis", assegurou Rosario Murillo, que também tratou de outros temas do seu governo.

"Vilma Trujillo foi queimada por membros de sua comunidade, que alegaram que ela estava possuída pelo demônio. A Polícia Nacional está realizando a captura dos responsáveis", assegurou Rosario Murillo, Vice-Presidente da Nicarágua
Já o site do jornal "El Nuevo Diario" deu destaque ao pastor evangélico Saturnino Cerrato e o Dom Silvio Fonseca, que condenaram o fanatismo, e o extremismo religioso no caso da jovem Vilma Trujillo.

"Esse caso é um exemplo claro de extremismo religioso, produto da ignorância e do fanatismo. O que foi feito é absolutamente incorreto e definitivamente o pastor responsável é culpado por essa morte e deve enfrentar o que a lei estabelece nesses casos", disse Saturnino Cerrato, representante das Assembleias de Deus, em entrevista para o "El Nuevo Diario". Ele não negou e nem afirmou, que o pastor Juan Rocha pertencia às Assembleias de Deus, dizendo que havia cerca de 2.000 representantes em todo o país, e que era "impossível conhecer todos eles". No entanto, ele disse que as pessoas não devem ser submetidas a esses métodos, porque "não se expulsava demônios dessa forma".

"Não entendo onde esse pastor estava com a cabeça ou qual tipo de conhecimento teológico ele possui. De repente se tornam fanáticos e se deixam levar por situações como essa, sendo que nesse caso, de qualquer forma, esse pastor tem que sofrer as consequências", completou.

Saturnino Cerrato não negou e nem afirmou, que o pastor Juan Rocha pertencia às Assembleias de Deus, dizendo que havia cerca de 2.000 representantes em todo o país, e que era "impossível conhecer todos eles"
Por outro lado, Dom Silvio Fonseca, coordenador da Pastoral da Família, Vida e Infância da Arquidiocese de Manágua, disse que ato de fanatismo deveria chamar a atenção dos seguidores das diferentes religiões que são praticadas no país, para que seus líderes não manipulem a liberdade e a consciência dos fiéis.

"Essas atitudes não dependem de religiões, mas das pessoas que as lideram, uma vez que não estão baseadas na palavra Deus, mas em sua própria ambição em manipular os demais. Essas são pessoas cujo fanatismo divide espaço com problemas psiquiátricos, e que têm uma grande capacidade de privar toda a liberdade e vontade de seus fiéis para conduzí-los ao seu rebanho", disse Dom Silvio Fonseca, que lembrou de um caso relacionado a um suicídio coletivo realizado em Jonestown, na Guiana, em 1978, em que 912 membros da seita "Templo do Povo", liderados por James Warren, um religioso norte-americano, tiraram a própria vida ao se envenenarem com cianeto.

"Temos que lamentar e prestar nossos sentimentos diante dessas situações, e prestar apoio, visto que nenhum país pode permitir que mate em nome da religião", completou.

Dom Silvio Fonseca, coordenador da Pastoral da Família, Vida e Infância da Arquidiocese de Manágua
No entanto, em uma outra notícia publicada pelo site do canal TN8, Rafael Arista, agora referido como "superintendente" das Assembleias de Deus, voltou a dizer que Juan Rocha não pertencia a organização religiosa como havia sido informado anteriormente. Ele disse que Juan Rocha não estava no "banco de dados das Assembleias de Deus, e que não tinha credenciais de pastor".

"Quero deixar claro para a população que ele não é pastor, não temos em nosso registro de ministros uma pessoa que se chame Juan Rocha. Os pastores das Assembleias de Deus possuem uma credencial. Não temos igrejas organizadas naquele lugar, que fica a 12 horas a cavalo de Rosita. Não temos igrejas organizadas, que são aquelas que possuem um corpo de líderes juntamente a um pastor para administrar a igreja", disse Rafael Arista.

Rafael Arista, agora referido como "superintendente" das Assembleias de Deus, voltou a dizer que Juan Rocha não pertencia a organização religiosa como havia sido informado anteriormente. Ele disse que Juan Rocha não estava no "banco de dados das Assembleias de Deus, e que não tinha credenciais de pastor"
De qualquer forma, voltaremos a esse assunto daqui a pouco, para saber realmente se Juan Rocha era mesmo um pastor ou se isso tudo era apenas para abafar a história.

Mais Detalhes Sobre a Morte de Vilma Trujillo Começam a Surgir das Cinzas: A Crueldade Sem Limites do Fanatismo Religioso


Em 1º de março desse ano, o site "La Prensa" chegou a noticiar, que durante uma coletiva de imprensa, em que as organizações em defesa dos mulheres anunciaram atividades para o dia 8 de março (Dia Internacional da Mulher), as mesmas condenaram as pessoas que queimaram Vilma Trujillo.

Fátima Millon, da Rede de Mulheres Contra a Violência, disse que contabilizou a ocorrência como "feminicídio", porque segundo ela "todos os atos de violência contra as mulheres, que terminam em morte por motivos de ódio é um ato de feminicídio". Já Mirna Blandón, do Movimento Feminista da Nicarágua, afirmou que era evidente a misoginia, a crueldade e a tortura que tinha sido infligida a vítima, em um caso que houve "abuso de poder", considerando que foi através de um líder, que nesse caso calhou de ser religioso. Confira também um trecho dessa coletiva de imprensa em um vídeo publicado pelo La Prensa, em seu próprio canal no YouTube, no dia 1º de março:



Também foi divulgado pelo La Prensa, que Vilma Trujillo teria passado cerca de seis dias em jejum, com seus pés e mãos amarrados, antes que seu destino fosse selado em uma fogueira. No mesmo dia voltou-se a repetir que Reynaldo Peralta havia recebido ameaças de morte da família do pastor Juan Rocha, ou seja, se ele voltasse a comunidade de Cortezal, o mesmo estaria jurado de morte.

No dia 2 de março, uma notícia do site "La Prensa" abria com a seguinte frase: "Deixem que apodreçam na cadeia". Essa era a reação de Reynaldo Peralta, dois dias depois de perder sua esposa. "Eu confiava neles, mas que diabo! Era simplesmente o diabo que andava atrás de mim. Olha, eu confiava neles, porque eles me diziam quando eu não ia (a igreja): 'olha, irmão, confie em Deus, aqui é a salvação", continuou.

Marvin, Roberto e Noel Trujillo García, irmãos de Vilma Trujillo
Estranhamente, Reynaldo mudou sua versão, e disse que um dia antes de Vilma Trujillo ser atirada na fogueira, tinha escutado sua esposa dizendo para diversos membros da congregação, que supostamente pretendiam "libertá-la, porque estava "endemoniada": "Vocês não estão prontos para me libertarem, demônios". Ele disse que escutou essa frase através de uma rachadura de uma das paredes da igreja, quando pretendia visitar sua esposa um dia antes da tragédia, mas seus irmãos de fé, ou seja, os membros da congregação o impediram. Disse também que ele e Vilma tinham se "juntado" há quatro anos, o mesmo tempo que passaram a frequentar a igreja.

"Eles me disseram que eu não podia ficar lá, porque seria afetado pelo demônio também", lembrou Reynaldo, dizendo que ele não acreditava que seria afetado. Acrescentou ainda que não pode fazer nada para entrar na igreja, e que resolveu se retirar, para ver como estava a situação da filha de 2 anos do casal. Em seguida, ele foi atrás de um "orador" para que o mesmo pudesse ajudar sua esposa, porque ele acreditava na necessidade de buscar alguém mais preparado para ajudá-la.

"Olha, eu dizia para eles: 'essa mulher não está endemoniada'. Já vi mulheres transtornadas, sempre me diziam que ao fazer jejum e orações, a doença vai embora", destacou Reynaldo, um pouco desconexo, e com dificuldades para relatar o que havia vivenciado. Ele disse que ao voltar da busca pelo tal "orador" descobriu que o "estrago estava feito", ou seja, que tinham a atirado no fogueira, e que a abandonaram em um barranco. Emocionado, Reynaldo disse que eles tinham tirado metade de sua vida.

Estranhamente, Reynaldo mudou sua versão, e disse que um dia antes de Vilma Trujillo ser atirada na fogueira, tinha escutado sua esposa dizendo para diversos membros da congregação, que supostamente pretendiam "libertá-la, porque estava "endemoniada": "Vocês não estão prontos para me libertarem, demônios"
Miurel Gutiérrez foi novamente entrevistado pelo La Prensa, e lembrou de um caso ocorrido há cerca de 12 anos na comunidade de Pueblo Santo, próxima a Cortezal. Ele disse que grande parte das mulheres foram supostamente violentadas por um pastor. Segundo o que foi comentado na época, o pastor mandava os homens irem trabalhar no campo e, então, supostamente "purificava" as mulheres. Quando o denunciaram, o pastor fugiu e não foi punido. Para Gutiérrez, esses casos são o resultado do abandono institucional dessas regiões remotas do país.

Naquele mesmo dia, o La Prensa noticiou que a Justiça tinha aceitado as acusações do Ministério Público contra o pastor e mais quatro pessoas. De acordo com o Ministério Público, os acusados agiram com uma agressividade deliberada, estava em número superior, sendo que a vítima estava totalmente indefesa. Além disso, o MP pediu a prisão preventiva de todos eles, os quais foram acusados de "sequestro simples" e homicídio.

"A vítima estava completamente indefesa, uma vez que estava com os pés e as mãos amarradas, e não tinha um bom estado de saúde mental, portanto não tinha vontade própria", disse Fabíola Mendoza, assistente da promotoria. Ela argumentou durante a audiência que os acusados deveriam permanecer presos, visto que são líderes religiosos e possuíam influência sobre os moradores de Cortezal, ou seja, poderiam obstruir as investigações.

De acordo com o Ministério Público, os acusados agiram com uma agressividade deliberada,
estava em número superior, sendo que a vítima estava totalmente indefesa
A juíza suplente Damarys Vanegas, do Décimo Juizado Criminal de Audiências Distrital de Manágua, atendendo ao pedido do Ministério Público, ordenou a prisão preventiva dos acusados, após aceitar a acusação de sequestro simples e homicídio. Embora o crime tinha ocorrido há centenas de quilômetros, a juíza disse que tinha competência para julgar o caso, visto que a morte da vítima tinha acontecido no Hospital Lenín Fonseca, na própria capital do país.

Além disso, o MP pediu a prisão preventiva de todos eles,
os quais foram acusados de "sequestro simples" e homicídio.
"O assassinato é resultado de um crime, e a morte aconteceu aqui na capital", disse Fabíola Mendoza diante da manifestação da defesa, que questionava a competência e o local onde o julgamento deveria ser realizado. De qualquer forma, mais detalhes sórdidos seriam revelados com o passar do tempo.

O Ministério Público acusou os envolvidos de sequestro simples, porque supostamente mantiveram a vítima por cerca de seis dias contra a sua vontade na Igreja da Visão Celestial das Assembleias de Deus, com as mãos e os pés amarrados, de 15 de fevereiro até 21 de fevereiro desse ano, quando os eventos ocorreram. Segundo a promotoria, o pastor Juan Rocha chegou à casa do cunhado da vítima no dia 15 de fevereiro, porque a mesma estava "endemoniada" e seria necessário levá-la para a igreja para mantê-la em jejum e rezar por ela, para expulsar o suposto demônio.

O Ministério Público acusou os envolvidos de sequestro simples, porque supostamente mantiveram a vítima por cerca de seis dias contra a sua vontade na Igreja da Visão Celestial das Assembleias de Deus, com as mãos e os pés amarrados, de 15 de fevereiro até 21 de fevereiro desse ano, quando os eventos ocorreram
Segundo a promotoria, o pastor Juan Rocha chegou à casa do cunhado da vítima no dia 15 de fevereiro, porque a mesma estava "endemoniada" e seria necessário levá-la para a igreja para mantê-la em jejum e rezar por ela, para expulsar o suposto demônio
O MP acrescentou que os acusados concordaram em matar a jovem, dividindo as funções. O pastor diria que a vítima estava possuída por um demônio, porque falava sozinha, cantava e não reagia quando falavam com ela. Esneyda simularia que teria recebido uma revelação de Deus, que dizia para acender uma fogueira nos fundos da igreja, onde a atirariam no fogo. Enquanto isso, Tomasa daria a ordem para os membros da igreja buscarem lenha e acenderem o fogo. Pedro e Franklin se encarregariam de amarrar a mulher a um tronco de árvore próximo da fogueira, onde a expuseram ao calor por quatro horas, de 1 às 5h da manhã, do dia 21 de fevereiro.

A juíza suplente Damarys Vanegas, do Décimo Juizado Criminal de Audiências Distrital de Manágua, atendendo ao pedido do Ministério Público, ordenou a prisão preventiva dos acusados, após aceitar a acusação de sequestro simples e homicídio
"A deixaram abandonada e exposta ao calor da chama e entraram na igreja. Posteriormente, saíram às 5h da manhã para rezar e pediram aos membros da igreja para fecharem os olhos, momento esse que os acusados Pedro e Franklin a lançaram na fogueira", disse Fabíola Mendoza.

"A vítima, que se encontrava totalmente indefesa, gritava desesperadamente e pedia ajuda, mas nada podia fazer, porque estava amarrada. Os cinco acusados deixaram, de forma cruel, que a vítima queimasse até morrer", completou. Confira o relato completo do Ministério Público sobre esse caso, em um vídeo postado pelo canal do "El Nuevo Diario", no YouTube, no dia 2 de março:



Vilma Trujillo foi resgatada por seu pai e por um primo por volta das 13h, e a levaram para um centro de saúde de Rosita. Em 23 de fevereiro a transferiram para o Hospital Lenín Fonseca, onde a mesma faleceu em 28 de fevereiro. Após a audiência, o pastor mencionou que o demônio, que Vilma tinha, era uma serpente, porque supostamente ela mesma teria dito isso para ele.

Confira também um trecho do que aconteceu durante a audiência preliminar em um vídeo publicado pelo La Prensa, em seu próprio canal no YouTube, no dia 2 de março:



"Essas coisas não aconteceram como dizem, não fui até a casa dela, eles que me levaram até lá, eu estava quieto na igreja. O que aconteceu tinha que acontecer, a família precisa compreender isso. Não foi minha decisão queimá-la. Nós estávamos há seis dias em jejum para libertar essa mulher, porque não era uma doença mental. Não, era um demônio que ela tinha, ela mesma disse que era o demônio de uma serpente e um abutre, que ela não conseguia suportar. Nós não a queimamos", disse o pastor Juan Rocha. Os advogados de defesa solicitaram prisão domiciliar para os réus, alegando que eles tinham crianças pequenas, e que os mesmos estavam desamparados em Rosita.

"No caso de Tomasa e Franklin, ambos são um casal e possuem quatro filhos com menos de dez anos de idade. As crianças estão desamparadas em sua comunidade, sem a presença de nenhum de seus pais. Juan Gregorio Rocha tem três filhos pequenos de 6, 4 e 2 anos de idade", disse o defensor público Peavell Guerrero.

Já Isidro Hernández, advogado de defesa de Esneyda, disse que sua cliente não teve participação, e que sua revelação foi mal interpretada pelo pastor Juan Rocha, e por essa razão pediu prisão domiliciar. De qualquer forma os pedidos foram negados, sendo que a primeira audiência do julgamento dos acusados acontecerá no dia 10 de março, e ficará sob responsabilidade do juiz Carlos Solís.

A Mídia Nicaraguense Finalmente Vai até Cortezal para Entrevistar os Moradores Locais


Na sexta-feira passada (3), o site do jornal "El Nuevo Diario" publicou uma matéria bem completa sobre a Igreja da Visão Celestial das Assembleias de Deus, sobre o referido pastor e os depoimentos de pessoas que moram nessa comunidade sobre o que havia ocorrido no local. Vamos resumí-la para que vocês possam acompanhar de forma mais dinâmica, combinado?

De acordo com o "El Nuevo Diario", a igreja do pastor Juan Rocha era uma casa de madeira rústica, janelas pequenas e chão de terra batida, onde cerca de 40 famílias frequentavam a mesma. A porta da frente estava fechada com um cadeado e ninguém havia retornado ao local desde que a polícia apareceu para prender os envolvidos na morte de Vilma Trujillo. Os instrumentos musicais e até mesmo o painel solar foram retirados ou furtados por membros da congregação. Em uma das paredes era possível ler um cartaz feito de cartolina e repleto de erros ortográficos, e sem muito sentido que dizia: "Sou o bom pastor, dá sua vida pelas ovelhas". Do outro lado da parede havia outro cartaz dizendo: "Felicidades família. Pastor, nós o encorajamos a seguir em frente".

De acordo com o "El Nuevo Diario", a igreja do pastor Juan Rocha era uma casa de madeira rústica, janelas pequenas e chão de terra batida, onde cerca de 40 famílias frequentavam a mesma
A porta da frente estava fechada com um cadeado e ninguém havia retornado ao local desde que a polícia apareceu para prender os envolvidos na morte de Vilma Trujillo
Cortezal é uma das comunidades mais remotas de Rosita, e para chegar ao local é necessário seguir por um caminho que foi construído parcialmente por máquinas, e outro por produtores rurais com a ajuda de pás e picaretas, que abriram o caminho para escoar mais facilmente suas produções. Seguindo pela principal estrada que liga Rosita a Puerto Cabezas, é necessário virar em direção a uma localidade chamada Risco de Oro e, em seguida, até uma outra localidade chamada "El Guapotal". De lá, a viagem pode demorar duas horas e meia em uma caminhonete 4x4. A partir de um determinado ponto não é possível mais avançar com a ajuda de nenhum veículo, sendo necessário continuar a jornada a pé ou então em um cavalo. De Guapotal até Cortezal, a viagem pode demorar cerca de 3 horas.

As casas são distantes umas das outras, sendo que a maioria são simplesmente casas bem precárias, choupanas. Por outro lado, existem fazendas bem grandes, com até 3,5 milhões de m². Ao longo do caminho é possível ver criações de gado, plantações de feijão, milho, entre outras.

As casas são distantes umas das outras, sendo que a maioria são simplesmente casas bem precárias, choupanas
Ainda segundo o "El Nuevo Diario", há dois anos, Juan Rocha, então com 21 anos, chegou a essa localidade trazido pelo supervisor Ismael Hernández, da Igreja Montes de los Olivos, com sede em Suklintingni, Bonanza, e que atende a 14 pequenas igrejas comunitárias. Marcedes Castellón, uma moradora de Cortezal, embora estivesse com medo, disse que recentemente o pastor havia coordenado "campanhas de cura", e cerca de 22 dias atrás tinha curado uma menina, que tinha sintomas semelhantes aos da vítima. Assim como as outras cinco pessoas, que se aproximaram para conversar com os jornalistas, Mercedes justificou e exaltou o pastor.

"Ele era tranquilo, nunca o vimos com ódio de nada, por isso nós dissemos: 'Vamos congregar aqui'. Nos parecia uma boa pessoa, embora fosse obreiro", disse Mercedes. Vale ressaltar nesse ponto que os moradores locais aparentemente passaram a dizer que Juan Rocha seria um obreiro, ou seja, uma espécie de "auxiliar do pastor", porém está claro para o Ministério Público que o mesmo era considerado anteriormente como um pastor da igreja. Enfim, uma outra moradora, chamada Maribel Sequeira, disse que chegou na igreja no dia 21 de fevereiro, por volta das 5h da manhã.

"Ele nos disse que um grupo de irmãos iria rezar pela mulher que estava doente, e que o restante deveria pemanecer rezando na igreja, então seguimos rezando e eles saíram", disse Maribel. Pouco tempo depois, Vilma seria jogada em uma fogueira, a aproximadamente 30 metros da igreja.

Local exato onde Vilma Trujillo foi queimada as 5h30 da manhã do dia 21 de fevereiro
"Depois ficamos sabendo que tinham jogado ela no fogo, e nos disseram que Esneyda del Socorro Orozco Téllez teve uma revelação divina, mas eles não interpretaram isso corretamente, e a jogaram no fogo. Esneyda estava tomada pelo Espírito Santo. Estava transmitindo a profecia, ninguém entendia nada, porque dizia em outro idioma. Somente uma pessoa entendeu, que foi a Tomasa Rocha, que revelou que ela (Vilma) deveria ser atirada no fogo", continuou Maribel.

Para todos em Cortezal, o verdadeiro culpado pela tragédia foi um "demônio" que fez com que Tomasa interpretasse errado o Esneyda dizia. Não havia ninguém na localidade que se atrevesse a falar mal do pastor, que ordenou que Vilma fosse queimada, uma atitude que vinha sendo condenada por líderes católicos e evangélicos, e considerado alarmante para grupos de direitos humanos, que qualificaram o incidente como um exemplo extremo de fanatismo e misoginia.

Distância entre o local onde Vilma Trujillo foi queimada até a igreja onde ela frequentava
"Ele era esforçado, não temos como falar mal dele. Desde que chegou a esse lugar, tem sido um homem esforçado e muito amável com a igreja, e não temos razão para falar mal dele agora que está nessa situação. Acredito que, como igreja, temos que ajudá-lo com orações, e temos fé em Deus que ele retorne", disse Maribel Sequeira.

O pastor Everth Enoc Chavarría Valdivia, que o conhece porque ambos eram supervisionados pelo mesmo pastor, disse que o acusado de assassinato é "exemplo de honradez e responsabilidade". Ambos foram recomendados pelos seus superiores das Assembleias de Deus, que são reconhecidos em Manágua. No entanto, os líderes das Assembleias de Deus em Manágua continuam insistindo que o pastor Juan Rocha não fazia parte da congregação, e que ele era apenas um leigo.

"Somos obreiros, isso é, nos mandam pastorear por um tempo e, em seguida, temos que passar nos estudos para então sermos oficializados", disse Everth Enoc.

Para todos em Cortezal, o verdadeiro culpado pela tragédia foi um "demônio" que fez com que Tomasa interpretasse errado o Esneyda dizia. Não havia ninguém na localidade que se atrevesse a falar mal do pastor, que ordenou que Vilma fosse queimada.
Segundo o El Nuevo Diario, Vilma chegou inconsciente em Manágua, na manhã de 23 de fevereiro, em um vôo que partiu da cidade de Bonanza. Seu marido, que esteve com ela o tempo todo, acusou o pastor de tê-los enganado. Disse também que ela podia ter sido violentada antes do seu comportamento ficar alterado. Em Cortezal, ela é lembrada como uma boa pessoa, uma crente fiel.

"Ela era tranquila, saudável e não tinha problemas mentais, Chegava na igreja e se congregava. Disseram para mim que ela estava endemoniada, e perguntei onde ela estava. Em seguida, seu irmão, Israel Trujillo veio procurar o pastor para rezar por ela e, em seguida, a levou para a igreja", disse Maribel Sequeira. Confira também depoimento de diversos moradores de Cortezal, em um vídeo especial realizado pelo La Prensa, e publicado no dia 2 de março, no YouTube:



A família de Vilma não está mais na comunidade, visto que temem por suas vidas. Os congregados da igreja também dizem que estão com medo. A esposa do pastor e suas filhas pequenas fugiram. Já em relação a "doença" de Vilma, as pessoas da comunidade que participaram da "oração de cura" disseram que tudo começou quando Vilma visitou um curandeiro. Ela começou a delirar e a rasgar sua própria roupa, e que por isso a amarraram. María Leonor Hernandez, uma vizinha da igreja, disse que sabiam que Vilma estava doente, e que a intenção era curá-la.

María Leonor Hernandez, uma vizinha da igreja,
disse que sabiam que Vilma estava doente, e que a intenção era curá-la
Já Mercedes Castellón, que frequentava a igreja há 7 meses, lembrou que pediram que fizessem jejum e orassem pela saúde da vítima. Ela chegou a dizer que Vilma se jogava no chão e falava obscenidades, sempre que o pastor a repreendia. No entanto, ela alegou que saiu do grupo algum tempo antes, porque não estava conseguindo ficar tanto tempo sem comer nada. Agora, no entanto, resta apesar saber qual seria o destino dos acusados, no dia 10 de março.

Aparentemente, não há nenhum tipo de sentimento de culpa entre as moradores de Cortezal, o que não é tão difícil imaginar, considerando outros inúmeros casos que ocorrem rotineiramente na América Central e Latina onde existem verdadeiros currais religiosos, onde a fé não é pregada, mas imposta como forma de lei. De qualquer forma, esse é um assunto para os meus comentários finais.

Comentários Finais


Para vocês tentarem entender o que eu chamo de "curral religioso" vou contar uma pequena história para vocês. No dia 20 de setembro do ano passado, às 8h da manhã, uma senhora chamada Rosa Villar Jarionca, 73 anos, de etnia Yánesha, foi queimada viva em fogueira perante adultos e crianças, em uma comunidade chamada Shiringamazú Alto, que conta com pouco mais de 200 habitantes. O local fica a cerca de 10 horas de distância do distrito de Puerto Bermúdez, um dos oito distritos da província de Oxapampa, Departamento de Pasco, no Peru. Basicamente, uma comunidade de difícil acesso em meio a selva, na Amazônia Peruana. Embora a comunidade sequer tenha sinal de celular, isso não impediu que a cena fosse gravada por uma testemunha, e pudéssemos escutar palavras de ordem de alguns populares. O vídeo foi enviado para a emissora Panamericana Televisión, porém não irei exibí-lo aqui. "Estamos dando uma lição a ela, que sirva de exemplo para outras comunidades. Vamos fazer justiça pelo povo... Queimem as bruxas", diziam algumas das pessoas que presenciavam o triste desfecho de uma vida, cujas chamas da fogueira arderam por cerca de dois dias seguidos. Rosa Villar tinha sido julgada e condenada por bruxaria, pelo própria comunidade sob a alegação que ela estaria provocando constantes cólicas nos moradores da comunidade. Luis Mauricio Chuquillanqui, promotor público do distrito de Puerto Bermúdez, localidade mais próxima do local do crime, disse a agência de notícias AFP, que visitou a comunidade somente três dias depois (devido a dificuldade de acesso), com cerca de 20 policiais armados. 

No livro de registros da comunidade era possível ler que de acordo com a maioria das autoridades comunitárias, os mesmos tinham decidido "eliminar" a senhora. Ainda era possível ler que tal ato deveria servir de exemplo para a comunidade e as demais, visto que tal comportamento não poderia ficar impune. Ao serem interrogados pelas autoridades, os líderes locais disseram que a decisão foi tomada em uma "reunião de emergência", e que o ato seguia o estatuto da Feconaya (Federação das Comunidades Nativas Yánesha). Para eles o documento estaria de acordo com a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em relação a decidir qual seria a punição de membros da comunidade, de acordo com suas tradições. Porém, a referência parecia ser ao artigo 9, onde menciona que "desde que sejam compatíveis com o sistema jurídico nacional e com direitos humanos internacionalmente reconhecidos, os métodos tradicionalmente adotados por esses povos para lidar com delitos cometidos por seus membros deverão ser respeitados".Na época, as autoridades em Puerto Bermúdez se limitaram a dizer apenas que as investigações estavam em "andamento". Sabem o que é mais triste? Nunca mais se falou absolutamente nada sobre o assunto, e duvido muito que alguém tenha sido punido. Entenderam agora, o que quero dizer com "curral religioso"? Isso é bem semelhante ao que aconteceu na comunidade de Cortezal, na Nicarágua, onde sob um determinado pretexto religioso e cultural, aplicaram uma sentença de morte a Vilma. Evidentemente, sabiam que ela iria morrer, mas isso pouco importava. Abandonaram-a em um barranco, com seu corpo latejando de dor, porque era necessário, talvez isso servissse de exemplo para os demais, que temeriam a Deus e ao seu onipresente e onipotente suposto pastor.

Caso não tenham percebido, ao contrário do que muitos fizeram, não dei ênfase a denominação a qual o suposto pastor pertencia, porque esse exemplo torpe e covarde de lidar com a vida humana acontece na maioria das religiões. Aliás, não depende de classe social, cor da pele ou sexo. Prefencialmente, no entanto, esses predadores que se dizem religiosos escolhem as vítimas mais fracas - mulheres humildes - para aplicarem seu julgamento perante uma corte de seguidores, cuja monstruosidade intríseca emerge em meio a escuridão. Esses supostos pregadores se consideram mensageiros da palavra de uma entidade divina, a qual não compreendem, mas que fingem entender simplesmente pelo prazer e pelo doce sabor de serem seguidos, de serem reverenciados como meras estátuas pagãs. Até agora não consigo imaginar a dor que Vilma sofreu, o que passou pela sua cabeça, o que ela sentiu a última vez que o ar fresco entrou em seus pulmões. Não consigo imaginar se ela sonhou ou teve pesadelos, durante cerca de nove horas jogada com feridas expostas e seu fígado e rim fustigados, pelo calor de uma fogueira, criada por monstros da pior espécie. Em uma foto divulgada, Vilma estava de olhos abertos, talvez perdida, talvez sem entender o que estava acontecendo ou talvez sabendo que iria morrer, e ao menos queria ter a certeza que não seria enterrada pelas mãos aqueles que tanto a fizeram sofrer. Não consigo imaginar o que podem ter feito com ela durante tantos dias, que ela ficou presa sem comer absolutamente nada. 

A pior parte é que muito antes disso, Vilma pode ter sido covardamente violentada, ter procurado ajuda de um curadeiro, o "remédio" fornecido ter apresentado algum efeito colateral, e por isso ela passou a apresentar um comportamento estranho. Talvez tenha sido apenas raiva por terem cometido algo assim contra ela, e saber que ninguém poderia fazer nada, inclusive seu marido. Uma terra sem lei, sem vida, sem esperança. Contudo, aparentemente os moradores locais atribuíriam a responsabilidade do estupro, a própria Vilma, como se ela tivesse pedido por isso, como se ela quisesse ou tivesse contribuído para isso. Um discurso que se repete em uma comunidade extremamente isolada é o mesmo que se repete nos grandes centros urbanos. Isso não é cultural, é a perversa e pura natureza caiada do homem, que faz porque se acha no direito de fâze-lo, e na certeza que permanecerá impune, que poderá recomeçar a vida nova, embora deixando um rastro de lama, livremente em outro lugar. Outra peça importante nessa história é Reynaldo, o marido de Vilma, porque ele disse que a última vez que a viu tinha sido no dia 3 de fevereiro e depois disse que a viu um dia antes da mesma ser covardemente queimada em uma fogueira. Medo de represália? Receio de pensarem que estava envolvido? Possível envolvimento com o caso? Muitas perguntas para poucas respostas coerentes. De qualquer forma, o fato de prenderem e exibirem publicamente os responsáveis por torturar Vilma Trujillo ficou praticamente sem importância, quando a imprensa foi até Cortezal e documentou que ninguém se atrevia falar absolutamente nada contra o suposto pastor, inclusive o exaltavam. O que adianta prender cinco, quando praticamente toda aquela comunidade deveria estar atrás das grades? Ao ver a expressão do rosto dos moradores locais, e a maneira com que se expressavam, notei que não foi apenas a Vilma Trujillo que morreu, todos nós morremos.

Até a próxima, AssombradOs.

Criação/Tradução/Adaptação: Marco Faustino

Fontes:
http://cnnespanol.cnn.com/2017/03/02/familiares-de-mujer-quemada-viva-en-nicaragua-habrian-sido-amenazados/
http://pysnnoticias.com/pastor-ata-y-la-quema-de-la-mujer-en-la-hoguera/
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http://www.elheraldo.hn/mundo/1049453-466/procesan-a-pastor-y-feligreses-que-quemaron-a-mujer-en-nicaragua
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