Por Marco Faustino
Contar histórias sobre seres humanos é sempre algo muito delicado a ser feito. Lembro como se fosse ontem, quando contei para vocês sobre uma antiga tradição de curar pessoas através das palavras, muitas vezes através de sussurros, que é mantida na Bielorrússia. A tradição é secreta, protegida, e não é transmitida para estrangeiros. O conhecimento sagrado vem sendo transmitido de geração em geração, de avô para neto, de avó para neta, e tudo que é falado é escolhido com muito cuidado. Aparentemente, as palavras certas têm o poder de curar pessoas e animais, proteger as famílias de eventuais problemas financeiros, do mau tempo, e até mesmo de doenças rogadas por bruxas e feiticeiros. Contudo, ano após ano, o número de pessoas que possuem esse conhecimento vem diminuindo, fazendo com que uma tradição milenar corra o risco de desaparecer para sempre. Naquela matéria, conhecemos uma sussurradora chamada "Babka Fiadora". Ela disse que nunca tinha ido à escola, nem mesmo uma única vez. Os tempos eram difíceis quando ela era jovem, e as crianças tinham que trabalhar. Durante 12 anos, ela cuidou de vacas em troca de comida. Teria sido sua avó, que lhe mostrou como usar ervas e lhe ensinou a sussurrar. Tudo teria sido repassado verbalmente, porque até hoje ela não sabia ler. Aliás, ela disse que só tratava as pessoas, quando sabia que seria realmente capaz de ajudá-las. Aquela foi uma matéria fascinante (leia mais: O Poder da Crença! O Segredo Milenar de Curar Através das Palavras e a Matança de Animais Devido as Crenças ao Redor do Mundo!). Assim sendo, após dois anos e meio escrevendo matérias e M.As para vocês, algo que fiz mais de 840 vezes, percebe-se claramente que não é um lugar que devemos conhecer, mas as histórias das pessoas que vivem em comunidades como as que existem no interior da Bielorrússia.
Entretanto, não é preciso viajar tão longe para ter uma história inacreditável para ser contada. Basta ir até uma cidadezinha chamada Azusa, localizada no Vale de São Gabriel, no Condado de Los Angeles, no estado norte-americano da Califórnia. Nessa cidade, que fica localizada a 37 km a leste de Los Angeles, você encontrará um homem chamado Mohamed Bzeek. Ele é muçulmano, imigrante e a única pessoa entre 10 milhões de habitantes, que moram do referido condado, que fornece amor, carinho, paz e tranquilidade em um lar adotivo para crianças em estado terminal. Crianças cujos pais as abandonaram, e lares que não foram capazes de cuidar de pequenos seres humanos, que muitas vezes encerram suas jornadas nas mãos de Mohamed. Crianças que não terão muito tempo de vida. Crianças que tocam e seguram os seus dedos tentando entender o que está acontecendo com elas, e muitas vezes sequer conseguem expressar o que estão sentindo. Mohamed convive diariamente entre a vida, a morte e o amor, sendo que ele faz isso há mais de 20 anos. Em tempos de tanta intolerância, de tantas mentiras, e de tanta dor disseminada pelo mundo, achei importante trazer essa história ao conhecimento de vocês. Aliás, estamos exatamente a três semanas do Natal e, não importa que você seja católico, judeu, budista ou muçulmano, essa história pode, sem dúvida alguma, transformar a sua vida. Vamos saber mais sobre esse assunto?
Conheça Mohamed Bzeek: Um Pai Adotivo, Um Heroi e Um Ser Humano Exemplar
Apesar de Mohamed Bzeek exercer um trabalho tão nobre e um papel de tamanha importância na sociedade norte-americana há mais de 20 anos, muito pouco se comentou sobre ele antes de fevereiro deste ano. Isso porque foi através de uma matéria publicada no site do jornal "The Los Angeles Times" no dia 8 de fevereiro, e de um vídeo especial sobre seu trabalho exibido pela rede de televisão de caráter educativo-cultural "PBS" (sigla em inglês para "Serviço Público de Radiodifusão"), alguns dias depois, que toda sua dedicação acabou tornando-se motivo de comoção mundial.
Foi com a frase "Eu sei que elas vão morrer", dita pelo próprio Bzeek, que o texto redigido pela jornalista Hailey Branson-Potts, do "Los Angeles Times", começou a contar a história do homem que vinha sendo o pai adotivo de diversas crianças, as mais doentes, por assim dizer, do chamado "sistema de acolhimento adotivo" do Condado de Los Angeles, por mais de duas décadas.
A jornalista Hailey Branson-Potts do jornal norte-americano "The Los Angeles Times" |
Naquela época, no entanto, Mohamed Bzeek passava dias e noites sem dormir cuidando de uma menina adotiva de 6 anos de idade, acamada devido a uma rara doença cerebral |
"Sei que ela não consegue me ouvir, não consegue ver, mas sempre falo com ela. Estou sempre segurando-a, brincando com ela, e a tocando... Ela tem sentimentos. Ela tem uma alma. Ela é um ser humano", disse Bzeek.
"Se alguém liga para nós e diz 'Esta criança precisa de um lar em um centro de cuidados paliativos', existe apenas um nome que conseguimos imaginar", disse Melissa Testerman, coordenadora de admissão do Departamento de Serviços Familiares e Infantis do Condado de Los Angeles, que tenta buscar locais para que crianças doentes possam viver.
Embora Rosella Yousef soubesse que Bzeek, um pai solteiro, estivesse muito atarefado em cuidar da menininha de apenas seis anos, cujos cuidados eram necessários em tempo integral, ela entrou em contato com o mesmo em dezembro do ano passado, durante uma festa de Natal dada pelo departamento, e o questionou sobre a possibilidade de adotar uma outra criança igualmente doente. Daquela vez, no entanto, Bzeek educamente recusou, porque não tinha condições de cuidar mais de criança ao mesmo tempo.
Devido as leis de confidencialidade, o nome da menina não podia ser revelado, porém uma ordem judicial especial permitiu que a equipe pudesse passar um tempo na casa de Bzeek, e entrevistasse as pessoas envolvidas no caso de sua filha adotiva.
"Para essas crianças, essa é uma sentença de morte", disse Mohamed Bzeek. Confira abaixo, um vídeo bem curtinho divulgado pelo "The Los Angeles Times" através de uma conta de terceiros, no YouTube (em inglês):
Bzeek, na época com 62 anos (ele faz aniversário este mês), era um senhor corpulento com uma longa e escura barba, porém com uma voz muito suave. Era era o mais velho de um total de 10 irmãos, nascidos na Líbia, sendo que ele chegou até os Estados Unidos como um estudante universitário, em 1978, praticamente fugindo do país. Anos mais tarde, através de um amigo em comum, conheceu uma mulher chamada Dawn, que se tornaria sua esposa. Dawn havia se tornado uma mãe adotiva no início da década de 1980, antes de conhecê-lo. Bzeek disse que os avós de Dawn eram pais adotivos, e que a mesma tinha se inspirado nos mesmos. Aliás, antes mesmo de conhecer Bzeek, Dawn havia transformado sua casa em um abrigo de emergência para crianças adotivas que precisavam de uma instalação imediata ou que tivessem sido colocadas sob custódia protetiva.
Dawn Bzeek se apaixonava por todas as crianças que ela adotava. Ela levava as mesmas para sessões profissionais de fotos durante as férias, e organizava as doações de presentes de Natal para crianças adotadas. Segundo Bzeek, Dawn era divertida, mas tinha um medo absurdo de aranhas e insetos. O medo dela era tanto, que até mesmo as decorações do Dia das Bruxas as assustava. Porém, Dawn jamais ficou assustada devido as doenças das crianças ou com a possibilidade que ela própria viesse a falecer.
Bzeek começou a cuidar de filhos adotivos, juntamente com Dawn, em 1989. Segundo ele, muitas vezes as crianças estava doentes. No entanto, Mohamed Bzeek viria a sentir a morte de um filho adotivo, nesse caso uma filha adotiva, cerca de apenas dois anos depois, em 1991. A criança era filha de uma trabalhadora rural que estava grávida, quando respirou produtos químicos pulverizados na lavoura. A menina tinha nascido com um transtorno da coluna vertebral, e usava um molde de gesso, que cobria o seu corpo inteiro. Ela nem mesmo chegou a completar um ano de idade, quando morreu em 4 de julho de 1991, quando os Bzeeks estavam preparando o jantar.
"Esse caso, em particular, me deixou muito mal quando ela morreu", disse Bzeek, enquanto olhava para uma fotografia de uma menininha usando um vestido branco e deitada em um caixão cercado de flores amarelas. Ele também disse que chorou três dias consecutivos por não aceitar e compreender a morte da menina.
Em meados da década de 1990, os Bzeeks decidiram cuidar especificamente de crianças em estado terminal, que tinham ordens para não serem reanimadas, porque ninguém mais cuidaria delas. Certa vez, eles cuidaram de um menino com síndrome do intestino curto, que foi internado por cerca de 167 vezes no hospital, durante seus oito anos de vida. Ele jamais conseguiu comer comida sólida, mas os Bzeeks fizeram questão que ele sentasse na mesa de jantar, com o prato vazio e uma colher, para que ele pudesse se sentir em família. Houve também uma menina, com a mesma condição cerebral que a filha adotiva atual da Bzeek, que morou com eles durante oito anos, depois de trazê-la para casa. Ela era tão pequena que, quando morreu, um fabricante de bonecas precisou fazer uma roupa para seu funeral. Bzeek carregou seu caixão nas mãos, assim como alguém carregaria uma caixa de sapatos.
"O segredo é que você precisa amá-los como se fossem seus próprios filhos. Sei que estão doentes. Sei que vão morrer. Faço meu melhor como ser humano e deixo o restante para Deus", disse Bzeek.
O único filho biológico de Bzeek, Adam, nasceu em 1997 com osteogênese imperfeita e nanismo. Ele era uma criança tão frágil que trocar sua fralda ou suas meias poderia quebrar seus ossos. Bzeek disse que nunca ficou chateado com as deficiências de seu próprio filho. Ele o amava da mesma forma.
"Foi assim que Deus o criou", disse Bzeek.
"Amo minha irmã. Ninguém deveria ter que passar por tanta dor", disse o tímido adolescente, em relação a irmã adotiva.
Por volta do ano 2000, Dawn Bzeek, esposa de Mohamed Bzeek, adoeceu. Ela sofria de fortes crises convulsivas, que a deixavam enfraquecida por dias. Ela mal podia sair de casa, porque ela não queria entrar em colapso publicamente. De acordo com Mohamed Bzeek, as frustrações de sua doença a consumiam. Houve um certo desgaste na relação do casal, e ambos se separaram em 2013. Dawn Bzeek morreu pouco mais de um ano depois. Aliás, Mohamed se emociona muito ao falar sobre ela. Quando se tratava de enfrentar as dificuldades das doenças das crianças, e o fato de saber que elas iriam morrer, Dawn sempre foi a mais forte.
"Amo minha irmã. Ninguém deveria ter que passar por tanta dor", disse o tímido adolescente, em relação a irmã adotiva. |
As temperaturas tinham oscilado naquela semana, e a menina havia ficado resfriada. Seu cérebro não conseguia regular completamente a temperatura corporal, então uma perna estava quente enquanto a outra estava completamente gelada. No elevador, seu rosto ficava avermelhando ao tossir. Sua garganta repleta de fleuma, gritava. As pessoas no interior do elevador desviavam o olhar. Bzeek massageou sua bochecha e segurou a sua mão, brincando com a mesma, enquanto sussurrava em seu ouvido para acalmá-la, ainda que ela não pudesse ouvir.
Para a Bzeek, o hospital havia se tornado um segundo lar. Quando ele não estava no mesmo, ele estava frequentemente no telefone com seus muitos médicos, as seguradoras que lutam por quem está pagando por tudo isso, os advogados que o representam e seus assistentes sociais. Sempre que ele e sua filha adotiva saíam juntos de casa, ele carregava uma pasta preta e grossa preenchida com seus registros médicos, e folhas e mais folhas de medicamentos.
"Aqui está nossa princesa. Ela está com um lindo vestido, como sempre", disse a Dra. Suzanne Roberts. A Dra. Suzanne conhece Bzeek há anos e viu muitos dos seus filhos adotivos. No momento em que a menina completou 2 anos, Suzanne disse que os médicos alegaram, que não haveria mais intervenções para melhorar sua condição de vida.
"Ninguém nunca quer desistir, mas tivemos que avaliar as opções", continuou, acrescentando que, a menina que precisava ficar presa a tubos de alimentação e medicação por pelo menos 22 horas por dia, permanecia viva graças ao Mohamed.
"Enquanto ela não estiver doente e de bom humor, ela vai chorar para ser mantida viva. Ela não consegue falar, mas ela consegue se fazer entender. Sua vida não é um sofrimento completo. Ela tem momentos em que se diverte, e se mostra bem feliz, e tudo isso é graças ao Mohamed", completou.
Em um sábado, no início do mês de dezembro do ano passado, Bzeek, Adam e enfermeira da menina, Marilou Terry, fizeram um almoço festivo em comemoração ao sexto aniversário da menina. Eles convidaram os pais biológicos da mesma, mas eles não compareceram. Bzeek agachou-se na frente da menina, que estava usando um longo vestido vermelho e branco e meias da mesma cor, e segurou as suas mãos, batendo palmas. "Heeey, você tem 6! 6! 6!", disse ele alegremente.
Bzeek acendeu as seis velas de aniversário em um cheesecake, e sentou a menina na mesa da cozinha, segurando o bolo bem próximo de seu rosto para que ela pudesse sentir o calor das chamas. Enquanto eles cantavam "Feliz aniversário", Bzeek inclinou-se sobre o seu ombro esquerdo, sendo que sua barba gentilmente encostou em seu rostinho. Ela sentiu o cheiro da fumaça, e um pequeno e tímido sorriso atravessou o seu rosto.
A Campanha de Financiamento Coletivo Criada no Site "GoFundMe" por uma Senhora Chamada Margaret Cotts
Não sei quanto a vocês, mas fiquei muito emocionado ao ler esse texto, que terminou da forma mais especial que poderia existir, diante de toda a situação apresentada. Só que a vida de Mohamed não seria mais a mesma após aquela matéria. Naquele mesmo dia, uma mulher chamada Margaret Cotts, 52 anos, moradora da cidade de Oakland, que fica localizada a 380 km a noroeste de Azusa, no estado norte-americano da Califória, ficou sensibilizada pelo texto publicado pela jornalista Hailey Branson-Potts, e resolveu criar uma campanha de financiamento coletivo no site GoFundMe, cuja meta era de apenas US$ 100.000, mas que atualmente já superou US$ 520.000.
Campanha de financiamento coletivo criada por Margaret Cotts no site GoFundMe |
Margaret ainda chegou a alegar que os Estados Unidos seriam um país melhor se todos pudessem ter um amigo muçulmano. Ainda segundo ela, em um momento de tanta retórica e de ódio gratuito, era realmente importante ter representações precisas e realistas dos verdadeiros muçulmanos norte-americanos.
Naquele mesmo dia, uma mulher chamada Margaret Cotts, 52 anos, moradora da cidade de Oakland, que fica localizada a 380 km a noroeste de Azusa, no estado norte-americano da Califória, ficou sensibilizada pelo texto publicado pela jornalista Hailey Branson-Potts, e resolveu criar uma campanha de financiamento coletivo no site GoFundMe, cuja meta era de apenas US$ 100.000, mas que já superou US$ 520.000. |
Na atualização seguinte, Margaret informou que Mohamed havia desabado em lágrimas ao ler os comentários positivos das pessoas, que estavam contribuindo, e que ele não fazia ideia da dimensão da campanha. Em menos de 5 dias, a campanha arrecadou cerca de US$ 140.000 através de 3.000 contribuintes, superando a meta inicial. Em pouco tempo e com diversas entrevistas sendo dadas a diversos veículos de comunicação norte-americanos e internacionais, a campanha havia arrecadado cerca de US$ 385.000, em mais de 70 países diferentes, incluindo o Brasil.
Mohamed Bzeek durante uma entrevista para a rádio canadense CBC |
Enfim, é incrível como um pequeno passo de um leitor pode mover o mundo, e ajudar pessoas que podemos verdadeiramente chamar de seres humanos. É justamente por esse motivo que me orgulho em escrever matérias como essa para vocês, porque basta apenas uma pessoa ser tocada por algum assunto, para que talvez, o mundo comece a girar de uma forma completamente diferente.
Algumas Reportagens e Vídeos Publicados Sobre o Mohamed Bzeek ao Longo Deste Ano
Conforme dissemos anteriormente, poucos dias após a publicação do "Los Angeles Times", ou seja, no dia 24 de fevereiro deste ano, a PBS publicou um vídeo com pouco mais de sete minutos sobre Mohamed Bzeek. Confira o mesmo abaixo, que foi publicado no canal da própria emissora, no YouTube (em inglês, mas vale a pena conferir as imagens):
A reportagem da PBS nos forneceu uma dimensão aproximada de como é o cotidiano de Mohamed. É possível ver a menina que ele adotou, as dificuldades pelas quais ela passa, o pequeno travesseiro bordado que havíamos mencionado, o momento de oração em uma mesquita local e, mesmo atualmente enfrentando tanta coisa sozinho, o único momento em que ele quase desabou em lágrimas foi ao recordar de uma pequena vida, entre outras dez, que ele não conseguiu salvar.
...o momento de oração em uma mesquita local e, mesmo atualmente enfrentando tanta coisa sozinho... |
...o único momento em que ele quase desabou em lágrimas foi ao recordar de uma pequena vida, entre outras dez, que ele não conseguiu salvar. |
A princípio, Mohamed nunca pediu ajuda financeira de forma realmente expressiva ou ostensiva, visto que seu trabalho e de sua esposa sempre foi muito silencioso ao longo de mais de duas décadas. |
De uma forma muito mais emotiva, justamente por não se tratar de uma reportagem jornalística, podemos ver Mohamed Bzeek um pouco mais a vontade para dizer o que realmente pensava diante da vida e das crianças que adota, e que muitas vezes são retiradas do convívio de pais viciados em drogas, sofrem negligência ou simplesmente são abandonadas por eles, porque os mesmos se recusam a cuidar de um filho(a) que possui uma doença terminal, ou seja, que não irá viver por muito tempo e não querem ter que lidar com a morte.
Aliás, Mohamed teve que encarar o medo da morte algumas vezes. Ele é diabético, teve um ataque cardíaco em 2012 e, em dezembro do ano passado, os médicos tiveram que remover 15 cm do seu cólon, após a descoberta de um câncer de cólon em estágio dois, na véspera do seu anivesário. Ele disse que teve que encarar sozinho os médicos, que não tinha família ou esposa para se apoiar, e que sentiu o mesmo medo que as crianças sentiam, ou seja, se ele que tinha 62 anos ainda tinha muito medo de morrer, imagine as crianças.
Sinceramente, acredito que ambos os vídeos mostrem imagens que vão muito além das palavras.
Sinceramente, acredito que ambos os vídeos mostrem imagens que vão muito além das palavras. |
Mohamed Bzeek visitando o túmulo de uma das crianças, que infelizmente faleceu sob os seus cuidados |
Já sobre a morte, Mohamed a encarava como uma parte inevitável da vida. Ele disse que fazia seu melhor por elas, no curto período de vida que tinham. De forma singular, ele disse que elas iriam partir desse mundo, sabendo que foram amadas o tempo inteiro.
Uma das últimas matérias sobre Mohamed Bzeek, e que foi publicada em 22 de junho deste ano, pertence ao Hospital Infantil de Los Angeles, que basicamente realizou um grande compilado sobre tudo que tinha sido publicado sobre ele até aquela data.
No texto é possível ler, por exemplo, que a maioria das crianças adotadas por ele são abandonadas logo após o nascimento, uma vez que os pais são avisados sobre um diagnóstico terminal ou percebem que será um fardo muito grande para a vida deles. Aliás, a perda de sua esposa, vítima de uma doença pulmonar, também havia impactado na quantidade de crianças adotadas, visto que ambos chegaram a cuidar de três crianças ao mesmo tempo, porém, sozinho ele conseguia cuidar de apenas uma.
Comentários Finais
Mohamed Bzeek não é médico, clérigo e nem mesmo o pai biológico da absoluta maioria dos seus filhos, mas para ele nada disso importa. Ele faz o que for necessário para que seus filhos se sintam seguros e amados, e não precisa de nenhuma faculdade para fazer isso. É difícil não se emocionar diante da maneira com a qual ele abraça aquela pequena menina e a envolve em seus braços, além da forma com que ele conversa com ela, ainda que ela não possa ouvir. Aliás, vê-lo segurando a mão de sua filha para fazer com ela soubesse que ele estava ali, e que não a deixaria enquanto ela quisesse e pudesse respirar, toca profundamente o coração de qualquer outro ser humano. Não sei definir Mohamed Bzeek. Não consigo encontrar palavras, que sejam suficientemente adequadas, e que estejam a altura de sua generosidade. Não consigo sequer dimensionar sua capacidade em prover amor em momentos tão complicados na vida de pequenas almas, que tiveram a felicidade de serem cuidadas por ele, enquanto estavam entre nós. Somente aquele que vive diariamente diante dessa situação ou acompanha de perto a evolução médica de crianças, assim como aquela menina, podem dizer ou avaliar, se o que Mohamed vem fazendo ao longo do tempo é certo ou não. Na avaliação da pediatra e de todos aqueles que conheceram seus inúmeros filhos ao longo de 20 anos, ele é o melhor entre 10 milhões de habitantes do Condado de Los Angeles, e não seria difícil imaginar que ele, possivelmente, estivesse entre os melhores dos Estados Unidos e do mundo. Muitos podem dizer que diversas mães cuidam de seus filhos em situações semelhantes ao longo de suas vidas, mas muito provavelmente ninguém cuidou de 80 crianças e enfrentou a dor de perder 10 dessas crianças ao longo da vida. A casa de Mohamed não é uma clínica médica. Ela representa um lar, uma família, a chance de ser verdadeiramente amado ou amada.
Após a criação da campanha de financiamento coletivo através do site "GoFundMe", os comentários através das redes sociais e de sites de notícias viraram verdadeiros campos de batalha, com alguns usuários alegando que Mohamed estava atrás de dinheiro, quando, na verdade já estava sendo muito bem pago pelo governo. Além disso, a discussão chegou ao ponto de um pequeno grupo de usuários alegarem, que Mohamed iria usar o dinheiro para financiar grupos extremistas. Sinceramente, apesar de pregar constantemente pela liberdade de expressão, não consigo entender o que se passa na cabeça de pessoas, que possuem essa linha de pensamento. Apesar da mídia impressa, televisa e das redes sociais terem se tornado um palco ainda maior de disseminação de conteúdo falso, alarmista ou sensacionalista nos últimos anos, aparentemente as pessoas estão perdendo completamente a noção da realidade. Muito provavelmente, quando uma criança em estado terminal está sendo cuidada por Mohamed, ela possui uma sobrevida muito maior do que o esperado. A expectativa de vida para aquele menina adotada por ele era de apenas algumas semanas, porém nos braços de Mohamed a menina conseguiu sobreviver por sete anos, sendo observada de perto por médicos do Hospital Infantil de Los Angeles. Se Mohamed realmente quisesse dinheiro do governo norte-americano, ele aceitaria cuidar de quatro ou cinco crianças ao mesmo tempo para receber mensalmente US$ 1.700 por cada uma delas. Em vez de se tornar um anjo salvador, ele seria um anjo da morte, e teria enterrado muitas outras vidas. Porém, não é isso que aconteceu ou acontece. Aliás, a campanha sequer foi criada por ele, mas por uma leitora, que se sensibilizou e resolveu tomar uma iniciativa para ajudá-lo em sua jornada. Portanto, soa vergonhoso acreditar que Mohamed usaria o dinheiro para matar ou financiar qualquer ação visando a morte de pessoas, ainda mais inocentes.
Infelizmente, o que mais vemos nas redes sociais, e na internet como um todo, são pessoas tentando jogar sociedades contra sociedades, religiões contra religões, sistemas contra sistemas, mas o que menos vemos são pessoas como Mohamed. Obviamente, existem poucas pessoas como ele, visto que nem todas teriam sua capacidade para lidar com situações extremas, tais como aquelas que ele enfrenta. Aliás, as que existem estão em um longo e doloroso processo de extinção, seja pela cor de suas peles, seja pelo tamanho de suas barbas, seja pela vertente religiosa que adotam ou, talvez, porque sejam simplesmente generosas. Mohamed é um exemplo de ser humano, não importa que ele seja muçulmano ou não. Se realmente chegarmos ao ponto de ignorarmos totalmente a expressão facial mais simples e fácil de reconhecer do mundo, que é a do amor de um pai em relação a sua filha, e passarmos a julgar as características faciais das pessoas, entraremos em uma era ainda mais sombria do que foi a década de 1940 na Europa. Assim sendo, aproveite esse período do Natal e ajude alguém que esteja ao seu lado ou próximo de você. Atenda aquele pedido que sua mãe ou seu pai lhe pediu há tempos, mas que você ignorou e deu as mais diversas desculpas. Realize um desejo de seu filho da sua filha ou simplesmente tente colocar o sorriso no rosto de uma criança. Pode parecer muito pouco perto do que Mohamed faz diariamente, mas será um grande passo para que um dia todos nós possamos estar ao seu lado, de alguma forma, e agradecê-lo por mudar nossas vidas.
Obrigado, Mohamed Bzeek.
Criação/Tradução/Adaptação: Marco Faustino
Fontes:
http://people.com/human-interest/california-man-foster-kids-terminally-ill/
http://www.abc.net.au/radionational/programs/religionandethicsreport/the-extraordianry-courage-and-love-of-mohamed-bzeek/8439624
http://www.asiaone.com/world/over-550k-raised-cancer-stricken-man-who-fostered-over-80-terminally-ill-children
http://www.cbc.ca/radio/tapestry/finding-solace-1.4063675/meet-the-man-who-only-fosters-terminally-ill-children-1.4066405
http://www.dailymail.co.uk/news/article-4206590/Libyan-Muslim-immigrant-cares-LA-s-dying-foster-kids.html
http://www.icpcn.org/visit-mohamed-blog-sophie-keiffer/
http://www.latimes.com/local/lanow/la-me-ln-foster-father-sick-children-2017-story.html
http://www.odditycentral.com/news/the-heartwarming-story-of-a-foster-father-who-only-takes-in-terminally-ill-children.html
https://www.chla.org/blog/patient-stories/the-father-last-resort
https://www.dn.pt/mundo/interior/homem-cuida-de-criancas-em-fase-terminal-ha-20-anos-eu-sei-que-elas-vao-morrer-5715924.html
https://www.facebook.com/gofundme/videos/10155199298183550/?comment_id=10155211753573550
https://www.gofundme.com/bzeek
https://www.pbs.org/newshour/show/foster-father-cares-terminally-ill-kids-no-one