Por Marco Faustino
Nosso país é extremamente rico em lendas e locais supostamente mal-assombrados, porém "santo de casa não faz milagre", e nem sempre conseguimos repassar essas lendas por falta de material audiovisual, ou seja, muitas vezes temos apenas algumas poucas imagens de baixa qualidade, apesar de um grande volume de texto. Uma vez que nossa principal plataforma é o YouTube, sempre é interessante termos a disponibilidade de vídeos, depoimentos de moradores locais ou reportagens de emissoras de TV locais para complementarmos visualmente o que estamos contando. No entanto, como vocês podem perceber isso nem sempre acontece, e boa parte desses casos e lendas acabam ficando sem a devida adaptação necessária da nossa parte. Existe até mesmo um quadro, cujo nome provisório seria "Lendas Assombradas", que vem sendo planejado há algum tempo, mas o principal problema é o formato do mesmo para que não fique cansativo para quem nos assiste. Quem sabe um dia tiramos ele do papel, não é mesmo? Uma postagem que ficou no aguardo de vídeos, que poderiam muito bem se encaixar nesse novo quadro, foi aquela sobre algumas lendas da cidade e nos arredores de São João del-Rei, em Minas Gerais. Lembram dela? (leia mais: Conheça as Lendas de São João del-Rei e Região: Os Contos e as Assombrações nas Ruas do Interior de Minas Gerais). Apesar da maioria das lendas ter um cunho intrisicamente religioso, particularmente adorei escrever e conhecer aquelas histórias. Com certeza também participaria do passeio noturno promovido através do espetáculo "Lendas São Joanenses" pelo Centro Histórico de São João del-Rei.
Agora, quando uma equipe de TV faz uma reportagem sobre casos de assombrações ou lendas, onde moradores locais relatam que teriam supostamente visto ou ouvido vozes de fantamas, o assunto se torna sempre algo muito interessante para comentarmos. É exatamente esse o caso sobre o espírito "centenário" de uma mulher, que por sua vez seria vista vagando e chorando copiosamente em uma escadararia, que leva até a Gruta de Nossa Senhora de Lourdes, na cidade de Alcântaras, no noroeste do estado do Ceará. Por trás dessa aparição e do choro, que deixaria qualquer pessoa que ouvisse arrepiada, estaria uma lenda macabra. Essa lenda, que teoricamente remonta há mais de um século, conta que uma mulher teria engravidado, e com medo de represália de seus pais, que não a aceitariam em casa por sequer ser casada, acabou escondendo sua gravidez. Assim sendo, ela teria dado a luz ao seu filho, no alto de um morro. Foi nesse mesmo local que a mulher acabou praticando um crime terrível, poucos minutos após o parto: a mulher teria matado seu próprio filho recém-nascido. Não aguentando de remorso por tal ato, em seguida a mulher teria tirado a própria vida. No entanto, seu choro e seu lamento clamando por seu filho, que ela mesma assassinou, poderia ser escutado até hoje nos arredores do local, onde atualmente existe uma pequena capela. Curiosamente, essa lenda tem uma forte semelhança com uma outra lenda bem popular no folclore mexicano e de muitos países da América Latina, a "La Llorona". Será que houve alguma inspiração? Vamos saber mais sobre esse assunto?
Um Pouco Sobre a Cidade de Alcântaras, no Estado do Ceará
Para quem não conhece, Alcântaras é um município brasileiro do estado do Ceará, que fica localizado a cerca de 260 km a oeste da capital do estado, Fortaleza. A cidade também está localizada na microrregião de Meruoca, e na mesorregião do Noroeste Cearense. Sua população estimada em 2010 era de cerca de 10.771 habitantes, sendo que a estimativa para 2014, segundo o IBGE, era de 11.247 habitantes, ou seja, é uma cidadezinha encrustada na Serra da Meruoca, que cresce em um ritmo bem lento.
Visão aérea da cidade de Alcântaras, no estado do Ceará |
Sobre a origem do Sítio São José, nas páginas 62 e 63 do livro, é explicado, que os primeiros moradores teriam chegado em 1757, ou seja, 33 anos após o primeiro casal branco a fixar residência na Serra da Meruoca, o casal Cel. Sebastião de Sá e sua mulher Cosma Ribeiro Franca, que no ano de 1724 tomaram posse da terra que receberam em sesmaria, medindo "duas léguas e meia", às margens do riacho Itacaranha.
Bertoni Vasconcelos Diogo, autor do livro "Alcântaras: III séculos de História" |
Com a chegada dos "Alcântaras", entre 1790 e 1800, o sítio São José passaria a se chamar São José dos Alcântaras, e posteriormente somente Alcântaras. Segundo Bertoni Vasconcelos Diogo, "o nome Alcântaras se deu devido ao grande número de pessoas na região com o sobrenome Alcântara". Num segundo momento o escritor alcantarense explica "que o sobrenome Alcântara, assim como a grande maioria dos sobrenomes no Brasil, tem suas origens na Europa, na Península Ibérica. No período colonial era bastante comum navios com imigrantes europeus atracarem em terras brasileiras em busca de riquezas; muitos destes imigrantes acabavam se casando e seus filhos herdando seus sobrenomes".
Segundo Bertoni Vasconcelos Diogo, "o nome Alcântaras se deu devido ao grande número de pessoas na região com o sobrenome Alcântara" |
aqui.
A Reportagem do Programa "Gente na TV", da TV Jangadeiro/SBT, Sobre o Espírito de uma Mulher que Aparece Chorando e Assombrando os Moradores de Alcântaras
Na cidade de Alcântaras, no interior do Ceará, uma história macabra vem apavorando os moradores da localidade. Segundo os moradores, em entrevista ao programa "Gente na TV", da TV Jangadeiro, emissora de TV afiliada do SBT, sediada em Fortaleza, o espírito de uma mulher apareceria chorando e assombrando os mesmos. Ainda de acordo com a reportagem, todos os dias, duas mulheres subiriam uma escadaria para rezar pela alma de uma mulher, que teria cometido um crime bárbaro: ela teria matado seu próprio filho, minutos após o seu nascimento, por medo que os pais descobrissem sobre sua gravidez.
Confira toda história que foi publicada no dia 31 de outubro, no canal do Sistema Jangadeiro, no YouTube:
É interessante mencionar que nos primeiro minuto de reportagem é possível ouvir a declaração de uma das senhoras (a que está usando uma roupa verde e preta) dizendo que nunca teria visto a "assombração", mas que o povo mais antigo mencionava que a via vagando pela escadarias, gritando, chorando e pedindo por seu filho. A "assombração" também teria uma espécie de hora marcada para aparecer: sempre de quinta para sexta-feira, e seria mais ativa em uma época mais específica do ano. Segundo uma outra senhora que aparece na reportagem, chamada Maria de Lourdes (a que está vestindo uma blusa roxa), era durante o inverno que essa mulher era mais frequentemente ouvida e avistada.
No alto da escadaria existe uma gruta dedicada a Nossa Senhora de Lourdes, porém bem mais acima, no topo do morro, existe a capela de Nossa Senhora das Graças (outros sites apontam que a capela seria dedicada a Nossa Senhora de Lourdes).
Na parte final da reportagem nos deparamos com um senhor que teria ficado "cara a cara" com a assombração. O homem relata que a mulher estaria vestindo uma "roupa branca com babados" e seria morena, em alusão a cor do seu cabelo. Assim que ela se aproximou, ela teria dito: "Vá se embora, porque senão venho lhe buscar". O homem, é claro, correu de medo, porque a "assombração" parecia ser uma pessoa viva.
Uma Reportagem Anterior Sobre Essa Mesma "Assombração", que Foi Exibida Pelo Programa "Riquezas do Ceará", da TV Cidade, no Ano de 2014
Essa história já tinha aparecido em um programa chamado "Riquezas do Ceará", exibido pela TV Cidade, emissora de TV afiliada da Record, sediada em Fortaleza, em meados de agosto de 2014. Confira a reportagem (a partir de 9:21 até 15:07), que foi postada no canal "Filipe Vídeos", no YouTube, no dia 16 de agosto daquele mesmo ano, que teria sido a data de exibição da reportagem:
Nessa reportagem, a assombração ganhou até mesmo um "apelido", a de "Mulher Chorona", citado pelo apresentador do programa após ser mencionado por um morador local. No entanto, maiores detalhes começam a surgir da própria narrativa do repórter, ao dizer que nem todo mundo da cidade conhecia essa lenda, mas, de fato, ela existia.
Pouco tempo depois o repórter conversou com um morador local, que conhecia "mais ou menos" a lenda. De qualquer forma, mesmo após 19 anos morando no lugar, ele mencionou que nunca tinha ouvido nenhum choro ou lamentação durante a noite, nem mesmo seus familiares. No entanto, pessoas "de fora", ou seja, vizinhos já teriam relatado algo dessa natureza, bem como a presença de lobisomens. Resumindo, informações bem desencontradas, ainda mais para um suposto crime teria acontecido há mais de 100 anos.
Durante a reportagem foram entrevistadas duas auxiliares de biblioteca, uma delas se chamava Maria de Fátima, conhecida como "Doda". Ela disse que nunca tinha ouvido falar de alguém que teria visto essa "assombração", mas que conhecia relatos de pessoas que já ouviram seu choro. Aliás, ela mesma disse que ouviu esse "choro arrepiante" quando tinha apenas por volta de 8 anos de idade, em uma rua próxima.
De qualquer forma, Maria de Lourdes mencionou que tudo teria ocorrido em uma época onde os pais escolhiam os maridos para suas filhas. Assim sendo, uma mulher teria tido um caso com um rapaz, teria engravidado dele, "escondido a barriga", e posteriormente matou a criança. Não se sabia quando exatamente isso teria ocorrido, muito menos a identidade da tal mulher. Maria de Lourdes ainda completou dizendo que a mulher não era do "centro da cidade", mas das redondezas, de sítios da região.
Enfim, uma história um tanto quanto questionável. Entretanto, é importante lembrar que isso se trata de uma lenda, que por definição é uma narrativa transmitida oralmente pelas pessoas (tal como a mãe de Mariazinha transmitiu para ela), visando explicar acontecimentos misteriosos ou sobrenaturais, misturando fatos reais, com imaginários ou fantasiosos, e que vão se modificando através do imaginário popular. Não quer dizer que seja necessariamente verdade, mas quase sempre é uma boa história, que vale a pena ser ouvida.
Uma Possível Inspiração de uma Famosa Lenda Mexicana e Muito Popular na América Latina, Chamada de "La Llorona"?
Se você costuma acompanhar o blog AssombradO.com.br ou o canal AssombradO, no YouTube, com certeza você dever ter notado, que essa lenda que corre a cidade de Alcântaras, no Ceará, é muito parecida com a lenda de "La Llorona". Caso você não saiba sobre o que se trata essa lenda, não tem problema, iremos explicar resumidamente para vocês.
"La Llorona" seria um proeminente fantasma pertencente ao folclore da América Hispânica, muito embora haja semelhanças com outras culturas e mitologias. De acordo com a tradição, "La Llorona"é o fantasma de uma mulher que perdeu seus filhos e chora ao olhar para eles diante de um rio, muitas vezes causando infelicidade a quem ouví-la. Em algumas versões da lenda dizem que "La Llorona" sequestra crianças que se pareçam com seus filhos, e os afoga em algum córrego. No México, por exemplo, é costume dizer que ela aparece em lagos e rios durante as madrugadas, e seu choro pode ser ouvido a uma distância considerável.
"La Llorona" seria um proeminente fantasma pertencente ao folclore da América Hispânica, muito embora haja semelhanças com outras culturas e mitologias |
Em uma rápida consulta ao Wikipedia (apesar de não ser uma fonte muito confiável em relação as informações nela publicadas) nos deparamos com um artigo chamado "Bela da meia-noite", onde aponta para uma lenda de uma mulher, geralmente vestida de branco, que aterrorizaria as pessoas no período da noite. Entre as inúmeras versões da lenda teríamos a de uma mulher grávida de 2 filhos, prestes a dar à luz, logo após o casamento, que teria sido abandonada pelo marido. Quando os filhos nasceram, ela teria matado ambos e fugido de casa. Mais tarde, no entanto, ela teria percebido o erro que cometera. Algo um pouco semelhante a lenda de Alcântaras. Apesar dos diversos relatos ao redor do mundo, aparentemente teria sido no México que essa lenda teria começado, ainda no século XVI, quando os moradores da Cidade do México se refugiavam em suas moradias durante a noite. Isto se dava, especialmente, com os moradores da antiga Tenochtitlan, que trancavam suas portas e janelas, e todas as noites eram acordados pelos prantos de uma mulher que andava sob o luar, chorando (daí o nome "La Llorona", que significa "A Chorona").
Não seria de se estranhar que essa lenda tivesse ganhado adaptações e variações, principalmente em pequenas cidades do interior do nosso país, e particularmente com grande representação religiosa. Tais lendas acabam ou acabavam servindo como uma espécie de "mecanismo de controle social", uma espécie de "instrumento de medo ou repressão" principalmente com o objetivo de que as mulheres obedecessem aos seus pais, aos bons costumes e as tradições locais. De qualquer forma, a lenda da "Mulher Chorona" continuará sendo contada em Alcântaras por aqueles que a conhecem ou ouviram o seu lamento, até que entre os vivos, é claro, a última voz se cale.
Até a próxima, AssombradOs!
Criação/Adaptação: Marco Faustino
Fontes:
http://portaljovensac.blogspot.com.br/2016/11/alcantaras-lenda-da-chorona-e-novamente.html
http://tribunadoceara.uol.com.br/videos/gente-na-tv/espirito-de-mulher-aparece-para-moradores-da-cidade-de-alcantaras/
http://www.panoramio.com/user/7386634/tags/CIDADE%20DE%20ALCÂNTARAS%20CEARÁ
https://blogalcantarasteste.wordpress.com/category/cultura/page/30/
https://www.clubedeautores.com.br/book/204038--Alcantaras_III_seculos_de_Historia?topic=geografiaehistoria#.WBsldkBvB0o
https://pt.wikipedia.org/wiki/Alcântaras
https://pt.wikipedia.org/wiki/Bela_da_meia-noite
https://www.youtube.com/watch?v=RCNg8EB8yNM
https://www.youtube.com/watch?v=p0wymc8N1is